quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

Temes o romântico? - Por Dom Angelo



Para algumas pessoas este texto será um atestado de cafonice de minha parte. Uma espécie de confissão obscura, ou mesmo uma revelação de “gostos duvidosos”.

Como muitos sabem, toco, estudo e pesquiso jazz. No mundo da música, sou fã de artistas como Miles Davis, Thelonious Monk, Bill Evans, John Coltrane, Ornette Coleman, Kenny Wheeler, ou de compositores como Stravinsky, Debussy, Bach, Liszt, Beethoven, Palestrina, e ainda de Jobim, Gismonti, Veloso, Buarque, Seixas, Ben Jor, Cartola, Science, sem esquecer de Gainsbourg, Pixies, Pistols, Floyd, Nirvana, Smiths, dentre outros.

Assim como a música desses mestres me emociona até hoje, algumas canções que fizeram parte da minha infância e pré-adolescência também me tocam de uma forma, digamos que...curiosa. Se você teve infância, pré-adolescência ou mesmo adolescência nos anos 80 e inicio de 90 sabe bem de que assunto estou falando.

Sabe aqueles momentos (quando não estava jogando Atari ou Master System) em que ficava ao lado do seu “rádio gravador” ouvindo a programação da rádio Cidade ou Transamérica, sempre com sua fita cassete a postos para gravar sua coletânea pessoal de sucessos? E aquele “clima de paquera” que rondava as discotecas dos condomínios e prédios? Quase sempre estava lá a menina que você estava afim e ficava ansioso para chegar o momento de chamar ela pra dançar uma música lenta. Com certeza você estava usando uma basqueteira M2000, um relógio Casio, calça jeans da Levis e uma t-shirt enorme quase chegando no joelho (ou você era da turma que usava dockside?).

Surpreende-me estar repetindo aquele clichê de saudosismo exacerbado para com certos momentos especiais. Mas o que psicologicamente os torna especiais? Você já deve estar cansado de ouvir do seu avô aquela frase: - no meu tempo é que era bom! Mas começo a desconfiar que nada disso está relacionado com a qualidade do que foi vivido, mas sim da sensação de novidade, do gosto pelo desconhecido, que seu ego começava a desfrutar.

A idade em que estou me referindo é justamente aquela da formação da personalidade¹ do indivíduo. São os momentos de adaptação social, intelectual e principalmente do contato e experiências com o sexo oposto. As primeiras conversas, brincadeiras e paixões. Sim! Paixões. E olhe que não era fácil. O ato de se apaixonar quando criança me remete a uma avalanche de sensações, dor e dúvidas. Pois é...o id² não perdoa!

Ao mesmo tempo, funcionando de substituição³ da vontade de voltar ao passado, aquelas situações de descoberta tiveram algum cheiro (Lapidus), algum gosto (Dipn'lik) e claro, alguma trilha sonora que embalou esses momentos mágicos. Assim, não é por uma opção RACIONAL que acabo por desfrutar de algumas músicas “cafonas” dessa época (como nos exemplos abaixo), mas sim por causa de uma ASSOCIAÇÃO psíquica e involuntária.

Ok? Tá explicado! Não tenho culpa no cartório!



e



¹ Segundo Freud, nossa psique está dividida em três partes: id, ego e superego.

² Fonte instintiva do nosso ser. Funciona buscando prazer e auto-conservação a todo custo. A principal força do impulso do “id” é a libido, energia voltada para sexualidade e sensações prazerosas.

³ Mecanismo de defesa do ego.

9 comentários:

  1. Grande texto, Angelito! Gosto de muita coisa dos 80 e 90. Suas escolhas foram excelentes! E espero que chegue logo dia 14 para ouvirmos e tomarmos umas nas confras de final de ano.

    Abraço,

    Giba Carvalho.

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  2. Vamos tomar várias ouvindo "sucessos Tio Dan". Hehehehehe...

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  3. Sensacional, Angelito! Essa sua descrição das festinhas não podia ser mais perfeita!A basqueteira M2000 hilária! Usei tanto basqueteira quanto dockside( o terror das mães,pois uma vez usada a meia não havia lavagem que tirasse a tinta que ficava). Abração, meu velho!

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  4. O fato não está na qualidade. Você pode curtir jazz, progressivo, erudito, etc, mas qdo o fator passional entra na história e essa tal confusão de sentimentos (que hoje são "facilmente" camuflados) toma parte no ouvir, às bulhufas com as minutas e dissonantes. As vezes me pego sentindo arrepios e uma boa (diria cavalar) dose de saudosismo qdo passo pela roleta do ônibus e o cobrador está com seu radio de pilha (hj caixas de alto-falantes chinesas) ouvindo o "save a prayer", "hunting high and low", ou a "clássica" Take my breath away. Espero a canção chegar ao fim pra por Right off do Miles. Aqueles 4 minutos são mágicos, e neles visualizo e, muito mais do que isso, sinto - como o Angelo bem descreveu - essa onda 80's e 90's. Respondendo a pergunta: Temes o romântico? A gente não teme o que vê sempre na frente do espelho.

    Tomé

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  5. Belo, belo Tomé...
    Essa do espelho foi no alvo!
    Abraços!

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  6. Sou a pessoa mais suspeita a falar disso. Eu era uma das que ouvia o rádio com uma fita a postos e, jogando Atari, ficava prestando atenção na hora que minha música favorita ia tocar. O new wave brasileiro fez mais a minha cabeça do que as músicas internacionais, porém, existe um fato curioso da minha vida que faz com que uma canção internacional marque uma parte da minha vida: "Hello" Lionel Richie. Todos os dias, às 11:30 eu passava em frente a uma casa e a dona estava ouvindo esta canção no último volume. Nunca esqueci e acabou se tornando minha preferida dele. Ah, e podem me criticar: eu sou apaixonada pelo romantismo e a superficialidade no new wave dos anos 80!

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  7. Amei o texto!
    Fiquei arrepiada só de lembrar dos maravilhosos "anos incríveis"!
    Realmente essa sensação de novidade, de 1ª vez, que não nos ocorre mais na vida adulta, é que era a mágica da pré-adolescência!
    Nasci em 1978, vivi plenamente os anos 80/90. Certamente não foram melhores nem piores que quaisquer outros, mas foram maravilhosos - para mim!
    Agora, Ângelo...tu vais ter de escrever um texto sobre música baiana - mais especificamente sobre a Banda Beijo - porque tua mãe já andou entregando que não só você, mas as meninas também, gostavam de ir pro Clube Português, dançar ao som de Netinho!:D
    E provavelmente dançávamos lado e lado e nem sabíamos!:p
    Quanto a isso: SIM, eu tenho muita culpa no cartório!
    Grande abraço!
    Tati

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  8. Tati. Isso aí não se revela. Hahahahahaha...
    Mas tudo bem. Quando fui ver o Netinho eu tinha por volta dos 8 anos de idade.
    Sendo assim, toma de presente pra tu: http://www.youtube.com/watch?v=weWFsqWh-l4
    Beijoca!

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  9. A descrição foi fabulosa, Angelito! De uma riqueza idílica!

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