terça-feira, 25 de setembro de 2012

Coletânea, The Bad Plus


Desde as primeiras manifestações musicais conhecidas como "Jazz" que seus atuantes, vez ou outra, constumavam mesclar a linguagem interpretativa deste estilo com músicas "de gosto popular", ou mesmo do universo "Pop".
Artistas como Louis Armstrong, Wes Montgomery, Miles Davis, George Benson, são apenas alguns dos que já tentaram experimentos desta inusitada fusão. Mais recentemente o pianista Brad Mehldau tem composto ótimas versões e releituras de músicas de bandas como Radiohead e Pink Floyd.
Porém ao meu ver, o grupo contemporâneo mais bem sucedido nesta trajetória chama-se "The Bad Plus".
Os excelente músicos deste piano-trio já se aventuraram em diversos arranjos em músicas conhecidas do grande público, e ao contrário de outros que o fizeram anteriormente, estes receberam muitos elogios.
Gostaria de compartilhar com os leitores deste blog uma pequena compilação que fiz com algumas destas gravações. Músicas como Comfortably Numb, Smell Likes Teen Spirit, Heart Of Glass, são apenas algumas presentes neste coletânea. Segue lá o link para baixar:

http://www.4shared.com/rar/fixsV_tE/The_Bad_Plus_-_Pop.html

Abraço a todos!

domingo, 23 de setembro de 2012

"Chorare meu povo...chorare" - por Gilberto da Costa Carvalho

     Primeiramente, gostaria de parabenizar os organizadores do Festival - No ar - Coquetel Molotov. Debutei este ano no mesmo, é verdade, e achei a estrutura muito legal e diversificada. Isto é extremamente importante para qualquer festival. Atrai e fideliza o público, fato.
Obviamente, que o que me levou ao festival foi a possibilidade de assistir na íntegra o "Acabou Chorare", disco clássico dos Novos Baianos que seria tocado por Moraes Moreira. Este, dispensa comentários.
     O show era saudoso por natureza, mas, quando me deparo com o público recifense sempre acho que é muito mais uma questão de moda (que já está tão fora de moda) do que de música em si. Moraes Moreira trouxe o que podia para agradar. Simpático, comunicativo e acompanhado de uma banda muito competente. E é exatamente neste ponto que meus problemas começam. Os técnicos de som do festival, erraram completamente na equalização do show do Moraes.
Essencialmente, o Acabou Chorare é um disco de samba. E triste daquele técnico de som que acha que samba é só contrabaixo e marcação de bateria. Perdeu a riqueza, o encanto que envolve a sonoridade do album e a audição ficou chata, marcada e sem detalhes.
     Outro ponto que gostaria de tocar, é a educação do público em geral. Num certo momento do show, resolvi fumar um cigarro fora do teatro. Fiquei encostado na parede e fui abordado por um segurança que falou: "Amigo, não pode fumar aqui por conta do ar-condicionado." Respondi calmamente - "Opa amigo, desculpe." Fui para área externa e continuei tranquilamente. O que há de anormal nisso? Tudo! O "correto" eram as pessoas fumando dentro do Teatro, bebendo cerveja dentro do Teatro, quem sabe até dando um "bolero" nas entrelinhas e os seguranças nem aí. Começo a achar que eu sou o anormal da história, até porque saí pra fumar este cigarro propositadamente depois de enxergar os absurdos supra-citados.
     Estes problemas educacionais e comportamentais têem se tornado constantes em relação ao público de Recife. Semana passada, um dos "ouvidos" que mais confio, esteve presente no show de Marcelo Camelo e falou a mesma coisa. Inclusive, me mostrou alguns vídeos que o próprio artista em questão teve que reclamar por conta dos flashes insistentes e da "colocação" do papo em dia no momento que executava suas canções. Principalmente, se tratando de um show no formato voz e violão.
     O público da noite de ontem, quis reencarnar o tempo do Campo Grande. É esta certeza que tenho. Vivenciar sua falsa liberdade e curtir suas agonias de modo extravasador dentro de um teatro.
Infelizmente, os quarenta mangos que gastei no ingresso não valeram a pena. E quando falo infelizmente, é algo totalmente verídico. Para mim, o Acabou Chorare é o melhor disco da história da Música Popular Brasileira. Riquíssimo em variações, ritmos, melodias e, de importância vital para várias gerações de músicos. E é muito triste quando você vai de coração e ouvidos abertos para escutar algo que você ama e as próprias pessoas que pagaram para estar lá, estragam. Estas mesmas pessoas não percebem que esta é a maior falta de respeito com o artista que ela se diz "fã". Isto realmente me irrita! E muito! E olhe que o som não estava nada bom.
     Certa vez ouvi isto - "As pessoas fazem barulho quando estão doentes". Não sei se é, qual é e a origem mas, tem certos tipos de comportamentos que só me levam a crer nisto. Não se trata um músico desta forma, não se trata a história assim e, principalmente, não se trata A MÚSICA deste modo.

Enquanto isto, coloquemos nossos discos, cd´s e mp3 e...

..."Chorare meu povo...chorare..."





Segue o Album na íntegra.


segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Entrevista com Fred Lyra - por Bruno Vitorino


Fred Lyra. Foto: Eládio Ferreira.

A pluralidade musical é uma das marcas mais indeléveis do Recife. Do frevo ao free jazz, a cidade acolhe uma gama de artistas que enveredam pelas mais diversas possibilidades expressivas que a música proporciona. Contudo, boa parte dessa produção é sistematicamente ignorada pela mídia convencional e jaz desconhecida pelo grande público. Buscando registrar/documentar o trabalho desses artistas, dou início a uma série de entrevistas com músicos pernambucanos. Nessa primeira edição, converso com o guitarrista Fred Lyra que fala sobre sua trajetória, projetos, planos e referências, muitas referências.

A teoria na composição musical não existe. No entanto, compor envolve uma profunda intuição de teoria” - Igor Stravinski

Bruno Vitorino - Primeiramente gostaria de perguntar: por que a guitarra? Fale-nos um pouco de sua trajetória.
Fred Lyra - Meus pais escutavam em casa, desde que eu era pequeno, muita música: Jackson do Pandeiro, Milton Nascimento, Bach, Debussy, Youssou N'Dour, Cesária Évora, música de várias culturas, países e línguas diferentes. Depois veio a guitarra e o rock: Black Sabbatt, Rage Against The Machine.  Através de  John McLaughlin conheci o jazz e a música clássica Hindustani. Depois que entrei na faculdade me aprofundei mais na música erudita e hoje divido meu tempo entre esta e a música improvisada, além de pesquisa em música indiana, africana e brasileira. Gosto muito de Bartok, Messiaen, Bach, Debussy, Ligeti, Stravinsky, Egberto Gismonti, Michel Leme, Steve Coleman, Steve Lacy, John Coltrane, Keith Jarrett, Afrocuba de Matanzas, Shahid Parvez, Benerjee. Destaco alguns professores que tive como: Thales Silveira, Sérgio Dias, Leonardo Melo, Itiberê Zwarg, Dierson Torres, Heraldo do Monte, Helder Araújo,e sobretudo, as aula com Steve Coleman, uma verdadeira mudança de como enxergar a música e a vida como um todo. Participei de vários grupos e toquei com músicos como Tim Berne, Paul Scea, Giuliano Modarelli, Ralph Alessi, Ramiro Mussoto, além ter morado um ano na Inglaterra e França. Atualmente toco com Mojav Duo, Nebulosa Quinteto, André Maria e Quarto Aberto, além de um trio de standards em bares e restaurantes. Também dou aulas na escola Tritonis.
BV - O projeto Mojav Duo traz uma formação bastante particular. Como surgiu a idéia de um dueto entre guitarra e bateria?
Mojav Duo por Eládio Ferreira
FL - Temos esse duo desde o começo de 2009. A primeira inspiração veio da música clássica indiana onde a formação básica é de percussão mais um instrumento melódico. No início, trabalhamos com um repertório de standards de jazz, brasileiros e cubanos. Tocamos muito Baden Powell, por exemplo. Tocamos esse repertório em algumas casas e bares do Recife. Em seguida, passamos a focar apenas nas nossas composições. Atualmente temos feito alguns festivais.
            O duo é um grande laboratório para testarmos novas ideias e conceitos. Aprendo muito tocando com Hugo Medeiros, pois ele é daqueles músicos inquietos que sempre aparecem com um desafio, uma nova ideia, o que faz com que as músicas sempre se renovem e nunca estejam engessadas. No Mojav Duo estamos aptos a experimentar e misturar todos os universos musicais pelos quais trafegamos. Algumas músicas são completamente arranjadas, outras abertas a muita improvisação. Desde o principio trabalhamos elementos da música africana, indiana e da improvisação jazzística. Hoje em dia estudamos bastante conceitos que aprendemos nos encontros que tivemos com Steve Coleman.
BV - As músicas do dueto fogem ao modelo AABA em 32 compassos e das cadências em II - V - I. Como é o processo composicional de vocês?
FL - Testamos muita coisa nos ensaios e trabalhamos vários conceitos. Às vezes, por exemplo, passamos horas tocando um único padrão rítmico. Tocamos composições minhas, de Hugo e parcerias nossas. Matenho uma gig semanal de standards, adoro tocar e aprender com eles, mas não é o tipo música que escuto dentro de mim. Minhas composições são inspiradas em tudo que estudo e escuto mas sobretudo no uso de modos e ciclos rítmicos e no conceito de centros tonais e modais. Creio que as influências do jazz, música erudita, brasileira, indiana, afro-cubana têm o mesmo peso.

BV - Se por um lado o Manguebeat deu destaque à produção musical pernambucana no cenário nacional, por outro a aprisionou numa abordagem regionalista caricata. Como é transitar fora desse padrão estético?

FL - A música é maior do que qualquer região, país ou corrente estética. Cresci ouvindo Chico Science & Nação Zumbi, Mestre Ambrósio, vou sempre ao carnaval, São João, trabalhei há três anos num laboratório de etnomusicologia onde faço pesquisas sobre maracatu junto ao CNPq (tendo inclusive sido premiado em congressos), gosto muito do mestre Valter (do maracatu Estrela Brilhante do Recife) do Bongar, Rabecado, Saracotia e vários outros. Tem muita gente que nasceu, vive e respira esses estilos. Outros estão neles apenas por questões mercadológicas. Procuro fazer a música que vivo. Ninguém precisa ficar se afirmando brasileiro ou pernambucano. Já somos desde que nascemos. Esta música é riquíssima por si só, não precisa desse tipo bandeira.
BV - Steve Lacy falava que "um músico que não toca está morto". Há julgar pelos poucos espaços para música instrumental no Recife, o que fazer para não morrer musicalmente?
FL - Buscar novas parcerias e tocar cada vez mais. A música é essencialmente ao vivo. Qualquer lugar pode receber música instrumental e qualquer pessoa é público em potencial. Steve Lacy, Michel Leme, Hermeto Pascoal, o AACM são inspiradores, pois sempre batalharam por isso. Existe público, mas ele, infelizmente, está distante. Há dois anos produzo a adaptação recifense do projeto "Jazz lá em Casa" e temos tido ótimos resultados. Para muita gente foi a primeira oportunidade de assistir à música improvisada. Um grande problema da música instrumental e da erudita é essa elitização que ambas sofrem. Como se fossem algo inacessível, uma coisa de outro mundo, "cool", intelectualoide, música para músico. E não é nada disso, é uma música como qualquer outra, possível de ser escutada e vivenciada por qualquer pessoa, de qualquer idade, renda e localidade. Mas, essa música não interessa ao sistema e este se encarrega de manter as pessoas longe dela. Nós, músicos, agravamos esta situação endossando esses conceitos, mantendo-nos distantes do público e uns dos outros. No momento que nos unirmos e passarmos a atuar como uma comunidade criativa, iremos aumentar significativamente os espaços, as possibilidades de trabalho e o público para esta música. Torná-la parte do cotidiano das pessoas. Creio que fazer a música em que acreditamos deve sempre ser o objetivo principal.
BV - Os dois meses de temporada no Teatro Joaquim Cardozo – julho e agosto - proporcionaram ao Mojav Duo a oportunidade de se apresentar constantemente e aprofundar seus experimentos. Qual o balanço que você faz desses concertos?
FL Foi uma experiência rara e engrandecedora. Fizemos nove concertos diferentes  nos quais podemos desenvolver mais a nossa música. Podemos chegar a um novo público e compartilhar a música com várias pessoas diferentes. A cada noite tivemos um ou mais convidados participando dos concertos. Tivemos os músicos: Cecília Pires, Caio Lima, Alípio C Neto, Luciano Emerson, Paulo Arruda, Mateus Alves, Enoque Ribeiro, Bruno Vitorino, Walter Areia e Wallace Seixas. Além destes convidamos a bailarina Liana Gesteira, o artista plástico Daniel Araújo e o grupo de teatro performático Totem, com as performers Lau Verissímo, Taína Verissímo, Gabriela Holanda e Juliana Nardin, além do diretor artístico Fred Nascimento, que também fez um som conosco. Também gravamos alguns vídeos com o cineasta Luís Henrique Leal, com a ajuda de Paulo Sano e Diogo Guedes. Foi muito gratificante fazer um som e aprender com todos, esperamos fazer mais em breve. 

BV - Quais os planos para o futuro?


FL - Basicamente estudar, tocar e compor mais. Esperamos poder gravar o primeiro disco do Mojav Duo até o final do ano. Também conhecer e tocar com outros músicos que estejam nesse mesmo caminho e colaborar mais com outras artes: dança, teatro, cinema, as artes plásticas são universos maravilhosos. Acho que o caminho da música é cíclico, não varia muito, mas, vai se tornando cada vez mais profundo e exigente. O universo musical é tão vasto que uma vida é muito pouco para o compreendermos bem, estou apenas iniciando nele, tem muita coisa para ser aprendida, escutada e escrita.