sexta-feira, 9 de março de 2012

"Ah, Se Já Perdemos a Noção..." - Bruno Vitorino


Chico Buarque irá se apresentar em minha cidade e isso me deixou bastante incomodado! “Absurdo”, bradariam esbaforidos os detentores da verdade e do conhecimento! No entanto, convido os dois ou três leitores que se aventuram a passar a vista por estas linhas a dizer: talvez... Existem causas e desdobramentos muito palpáveis em meu mal estar e é sobre eles que me debruçarei.
Não gosto de dogmas por uma razão simples: eles se baseiam na submissão irrevogável à certeza. E quais certezas temos nesta vida, senhores? Até onde sei, o mundo é constituído senão de dúvidas e são elas que movem a humanidade. Portanto, se nas questões mais materiais não encontramos a tão falada verdade universal, o que se dirá a respeito dela na arte? Logo na arte que se baseia no subjetivo!
Atiro então a primeira pedra: o senhor Chico Buarque sempre me pareceu superestimado enquanto poeta e músico! De fato, ele tem um cancioneiro com mais de 350 músicas, mas ataco novamente: dessas, quiçá 10 sejam geniais. E vou mais além, meus caros: a grandeza de boa parte dessas 10 canções deve muito aos parceiros do sr. Buarque. Se me permitem, far-me-ei mais claro. O que seria de “Eu te Amo” sem a harmonia cromática de Tom Jobim? Ou de “Samba de Orly” sem os acordes de Toquinho e as palavras também ditas por Vinícius de Moraes? E de “Cio da Terra” sem o tino de Milton Nascimento? E ainda de “Cálice” sem as idéias melódicas de Gilberto Gil?
Sigamos, contudo, meus leitores! Se é que ainda há algum a essa altura... E se eu estiver completamente equivocado – como eu gostaria – nessa minha assertiva? E se Chico Buarque de Holanda for um gênio vivo? Tudo bem, aceitarei essa premissa. Entretanto pergunto: isso justifica cobrar ingressos que custam em média (aritmética simples) R$ 265,00 num país onde o salário mínimo é de R$ 622,00!? Façamos as contas: multiplicando os 9.200 ingressos disponibilizados para as quatro apresentações que o artista fará em Recife pelo valor médio da entrada, chegamos ao montante de R$ 2.438.000,00. Escreverei por extenso para os devotos do poeta: dois milhões, quatrocentos e trinta e oito mil reais é o que renderá a vinda deste senhor ao Recife.
“Qual o problema, meu caro? Trata-se aqui de um verdadeiro gênio!”, pode estar pensando o meu leitor. Para este, eu replicarei que em termos de gênio, em novembro de 2010, tive a oportunidade de assistir ao concerto de um dos maiores nomes da história da música: Ornette Coleman. E paguei módicos R$ 40,00 (quarenta reais) para ver e ouvir uma lenda viva que continua a se reinventar aos 80 anos de idade! Por que então haveria eu de pagar um valor tão exorbitante para assistir a um compositor que há 20 anos (ou mais) parou no tempo e nada mais é do que cópia de si mesmo? Se o intuito for cantar junto, mais me apetece o videokê. Sai mais em conta...
Grita então o provinciano convicto: “E qual a importância de Ornette Coleman para o Brasil, meu camarada?!”. Retruco com firmeza: E qual a importância de Chico Buarque para o mundo, meu senhor?!
A você, meu querido leitor que comprou um ingresso a R$ 350,00 e acha que por um instante relembrará as delícias do paraíso perdido, digo: encontrará o que tanto procura. Nada verá de novo e de artisticamente relevante. Isso não importa! Porém, sairá do teatro crendo que andou vários passos em direção ao horizonte da intelectualidade por ter experimentado a ímpar sensação de ter visto um gênio incontestável no palco, mesmo sabendo que se trata de um embuste. E o preço dos ingressos nada mais representará que um aditivo a esse sentimento de triunfo acadêmico, obviamente, de modo que dirá a todos “Fui ao concerto de Chico Buarque!” e esperará que os que o ouvem, olhem-no com admiração e pensem “Nossa! Quanto requinte!”.
Porém, rogo ao senhor com toda humildade que não censure o comum brasileiro que não tem condições de pagar por tal liturgia intelectual e prefira se refestelar na efemeridade do inútil ao escutar “Ai, Se Eu te Pego”, “Eu quero Tchu, Eu quero Tcha” ou o “Melô das Novinha” comendo espetinhos de procedência duvidosa e tomando cerveja barata. É um fato que esses pobres mortais passam a anos luz da nossa Música Popular Brasileira, mas diria sem hesitar que a MPB não faz a menor questão de se aproximar desses bestializados mesmo cantando que “vai passar nessa avenida o samba popular”.
Contraditório? Sim, deveras. Mas, quem se importa?

12 comentários:

  1. Falei quase tudo isso, antes de ontem pra minha esposa. É fácil aplaudir quem partilha a mesma idéia da gente.. eu não posso fazer outra coisa a não ser aplaudi-lo pela lucidez.

    Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!Clap!

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  2. Cara, tive que compartilhar... O texto está muito bom.

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  3. "Ah se já perdeste a noção" do que Chico Buarque e suas não apenas belas, mas construtivas canções representam para o Brasil, onde figuras como vc possui um blog para nos dias de hoje livremente expressar opiniões que foram conquistadas com suor, lágrimas e muita criatividade por uma geração da qual provavelmente vc não faz parte.Pois vc sabe ou pelo menos deveria saber que foi Chico com suas canções que traziam e ainda trazem mensagens de esperança e coragem para todos que lutaram e ainda lutam com coragem e idealismo por um país mais justo e menos desigual que abriu a janela para os novos tempos de liberdade que hoje vivenciamos.No mínimo merece um pouco mais de respeito!
    Perdão, Bruno Vitorino, mas certamente vc não é parte desse tipo de brasileiro que preza e respeita os que por um dom natural que lhes foi conferido se situam muito acima de opiniões como a sua. Por não fazer ainda parte dessa classe de pessoas "fora da curva" como o Chico, é que tomo a mesma liberdade que vc hoje usa para, então, expressar livremente seus recalques através de um blog para tentar abrir seus olhos para uma realidade que teima em não enxergar.

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  4. Dona Zais, ou seja lá quem esteja por trás desse nome lhe esconde, (porque é muito fácil nesse mundo internético a gente camuflar-se atrás de qualquer coisa que pareça um nome ou uma idéia), quem vai discordar da sua posição agora sou eu. E eu tenho nome e não tenho vergonha nem medo de expor este nome, publicando meu blog, comentando nos alheios, emitindo minhas opiniões e conservando ou até mesmo mudando meus conceitos. Eu digo a senhora, que deve ter mais ou menos a minha idade, 66 anos, já que convivi com a era Chico Buarque, tanto quanto parece que a senhora conviveu. Pois lhe asseguro, minha senhora: o tempo não para, como disse Cazuza, de quem também não sou minimamente fã. Aliás, da obra dele, coitado, só gravei essa frase. Acontece, minha senhora, que vivi muito mais todas essas "fases" da assim chamada MPB (epíteto ridículo criado nos tempos da ditadura por gente vassala dos Chicos Buarques da vida, por mero modismo discriminatório de tudo quanto não fosse um bossanovismo de interesses -às vezes politicamente mal-disfarçados.) Assim, tudo quanto não fosse, nesta época que vivi como músico profissional e universitário de Direito, engajado num esquerdismo sem muita base teórica, mas apenas como contestação de um regime que obviamente desagradava a praticamente todos os brasileiros, eu incluso, estava como se dizia "fora do contexto". Era coisa de reacionário, de milico, de direitista. Ou seja, a religião criada em torno do semi-deus Chico Buarque, a quem hoje prefiro chamar Chico Buraco, devido ao tremendo "achado poético", estranho e inexplicável "achado" de louvar e de amar uma "Mulher sem Orifício" (vôte !, como diz o matuto), para mim é apenas isso: uma religião com altos níveis de fanatismo e imbecilidade, que eu chamaria de "Chicologia Talvez Poética, Talvez Babaca".. (continuo)

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  5. concluo... Bruno Vitorino, apesar da idade, minha senhora ou seja lá o que a senhora for (somente acho que não á ZAIS coisa nenhuma, que isso parece mesmo nome inventado, ou como dizem os internéticos um mero "nickname" de quem não quer aparecer), dizia eu, Bruno Vitorino tem muito mais idade cultural e musical do que a senhora pensa. E eu acrescentaria também outro fator que a senhora nem advinha o que seja: Habilidade Musical.. Continue, dona Zais, a louvar seu semi-deus que gosta da “ champanhe nacional lá de Paris” e de cortejar mulheres alheias, a maior parte passadas do ponto, Paris de onde só sai pra louvar o deus dele, um barbudo ultrapassado que mora numa ilha-prisão administrando o pouco que lhe resta de vida à custa de toda uma população escravizada, pobre (pobre não, miserável) que sobrevive Deus sabe como das migalhas que alguns semelhantes também louvados pela senhora jogam na sua desvalida cuia. Retirarei tudo o que disse acerca do humanitarismo, da sensibilidade, do desapego material desse senhor, desde que ele topasse passar o resto dos seus anos na “ ilha maravilhosa de papai fidel”... Porque, minha senhora, o verdadeiro artista não se divide.. ele expande para a sua vida o que canta na sua obra, o que pinta nos seus quadros, o que mostra nos seus filmes, o que diz nas suas canções, o que escreve nos seus livros. O verdadeiro artista é uno com a sua criação. Não desdenha o povo que lhe cultua, em benefício de burras cheias de dinheiro. Isso se aplica,principalmente, aos que nem têm mais onde guardá-lo. Em resumo, Chico Buraco pra mim, foi aquele da minha juventude inocente e vibrante. Aquele cara ainda jovem que –como eu, amava os beatles e os rolling stones, mas fazia de conta que era um ser iluminado que tinha uma missão no mundo: implantar um regime de igualdade, divisão de riquezas e de cultura.... Pois sim....Mas, eu cresci e aprendi a enxergar o homem, através das suas contradições. Em tempo: mesmo apesar de tudo, não somente de você, o mundo muda, Dona Zais.. Mudar o Brasil foi questão de tempo e não foi somente o seu semi-deus que fez alguma coisa pela pátria. Fomos todos nós, inclusive a senhora e eu...E nada mais eu digo, nem que me seja perguntado.

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  6. Ahahahahahaha!
    Zais, vc acaba de reescrever a História, fofinha...
    Quanta inocência idealista de DA!
    Filhinha, não foi Chico Buarque que mudou o destino do país!
    Era só o que me faltava!
    :D
    Shane

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  7. Assim como Fred, não tenho por que "inventar" um nome, visto que, a verdade deve ser dita. Tenho 53 anos, sou socióloga e também pude vivenciar de forma atuante, uma vez que era militante de carteirinha do Partidão-PCB, a restauração da democracia em nosso país. Evidente que Chico tem sua importância dentro de nosso contexto histórico, político e musical, mas concordo com Bruno quando ele diz que ele não é "um gênio incontestável", e que "tornou-se a cópia dele mesmo". Chico não pode ser visto como uma lenda viva ou como um símbolo musical de nossa democracia. Gostaria de lembrar que, grandes compositores e intérpretes foram perseguidos, exilados e até torturados pelos militares (a ex: Geraldo Vandré), e nunca tiveram o devido reconhecimento. Então eu pergunto: Por que só o Chico? Serão seus olhos verdes? Será porque é um atestado de capacidade intelectual que recebemos ao dizer que "somos fãs e assistimos seu show"? Ou será porque todo "esquerdista" que se preze não pode perder sua apresentação sob hipótese alguma(até porque ficaria sem ter o que falar nas reuniões partidárias)? Não sei, a única certeza que tenho é que Chico não é mais o mesmo. Infelizmente, a maioria de seus seguidores pararam no tempo, e até hoje continuam "lutando" contra a ditadura militar. Temos músicos extraordinários, que não têm seu talento reconhecido com tanto entusiasmo, que os devotos de Chico com certeza não pagariam sequer alguns poucos reais para assistí-los, cito, por exemplo, os pernambucanos Naná Vasconcelos, Antônio Carlos Nóbrega, Mestre Salustiano (faleceu recentemente) e tantos outros. Nossa cultura, é uma das mais ricas do país, produzimos talentos incomparáveis, reconhecidos no mundo todo, menos por nós mesmos, nós, que deveríamos nos orgulhar da "prata da casa", pagamos seja lá quanto for pra ver axé, pagode, e a "verdadeira" MPB. Assim, senhora Zais, vá ler Roberto DaMata pra ver "O que faz o brasil Brasil"!! E você Bruno, está coberto de razão, é um absurdo o preço desses ingressos, está mais do que claro que esse show é exclusivamente para a elite (burguesa) que Chico Buarque, um dia, tanto criticou!!

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  8. Cristina, minha querida, lucidez é isso aí.. O que você disse sobre esse artigo fantástico e corajoso do Bruno reflete simplesmente a Verdade, no seu estado mais puro. O brasil não conhece o Brasil. Acho que país nenhum no mundo tem o potencial criativo deste povo de uma cultura tão variada e rica. De Norte a Sul, de Leste a Oeste deste País imenso, milhões de pessoas têm o que dizer, mas não têm a quem dizer. Fazem Arte naturalmente, são vocacionados, nasceram pra isso. Porque temos que engolir passivos o que dizem os "mandatários" e o que querem os cafetões da Cultura do povo? É uma vergonha a maneira como os mitos são construídos neste País... Basta de fanatismo !

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  9. Bruno, Fred e Cristina, vocês fizeram meu dia mais leve. É bom saber que pessoas que respeito pensam.
    Admirei, e muito, o Chico da minha adolescência e reconheço sua "importância" histórica mas há algum tempo
    aquele Chico, da Roda Viva, Ópera do malandro se perdeu. Minha decepção começou com os romances. Em Passo Fundo, o prêmio entregue na Jornada de Literatura,a um dos livros foi muito questionado.
    E é no mínimo, incoerente, pagar meio salário mínimo pra ver/ouvir alguém que defendia o acesso à cultura para todos.
    Maria Nair Monteiro da Cruz

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  10. Texto formidável, Parabéns!

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  11. A discussão a respeito de Chico Buarque ser ou não o baluarte da luta social no Brasil, e o fato de se tratar de um senhor detentor, é verdade, de bens e metais à varejo, nada tem que ver com a obra artística que ele produziu. O artista não tem nenhum compromisso com o que quer que seja veiculado em sua obra. A arte tem vida própria e, uma vez trazida à baila em nossa existência despropositada, o que vale é tão somente a obra em si. Se Chico Buarque é socialista, capitalista, comedor de mulher alheia ou santo do pau oco, não faz a menor diferença para o fato de que sua obra é algo admirável tanto pela sua extensão quanto pela sua qualidade. Gostariam os artistas citados de serem os responsáveis pela qualidade do que Chico Buarque compôs. Não é verdade. Não se sustenta argumentar contra uma obra se valendo, para tanto, do descrédito a priori daqueles que a admiram ou que lhe dão valor. Quando se argumenta contra a qualidade de uma obra como a de Chico Buarque é preciso afirmar "A música e a poesia de Chico Buarque são boas", e desenvolver argumentos bastantes a justificar o ponto. Eu mesmo, no meu Daileon, ouço bastante a obra do músico e acho que se destaca de forma aguda na música brasileira. Não visualizo quem quer que tenha sido capaz de representar e tratar a vida e os sentimentos cotidianos com tamanha categoria e melodia. Do samba carioca à música nordestina, Chico Buarque passeou pelos diversos estilos musicais com representação teatral daquilo que nos é comum, os sentimentos da vida. Um grande artista, sem dúvida, cuja admiração popular terminou por gerar nos intelectualóides de plantão aquele ciuminho de quem vive de querer ser o possuidor da grandeza e qualidade artísticas.

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  12. Sr Jaspion The Great:
    Tudo o que o senhor escreveu, infelizmente, não merece sequer a descarga na privada da incompetência escondida no seu anonimato. Quem será Jaspion The Great, oh soberano Deus ! Pra início de conversa um pretenso sujeito metido a intelectual justamente porque é escravo cultural da "obra" de Chico Buraco. Aliás, quem sabe, não é o próprio ?! Somente esse ridículoo apelido que o senhor usa já indica que tipo de pessoa vazia o senhor é ! Jaspion, salvo engano, era um "super-herói" igualmente ridículo e mal desenhado por japoneses capitalistas do jeito que Chico Buraco, seu deus pequeno, imagina. Um falso mito criado por burgueses dominadores. Enfim, elevado à potência de "Great" mais se acentua a sua péssima escolha, sr Japion/Chico/pobre escravo de Chico/ou simplesmente covarde comentarista. Ora cresça e apareça, pequeno Jaspion. E tem mais, só pra terminar.. Falamos aqui no Brasil o Português, se o senhor não sabe. Está me entendendo, Grande Coisa Nenhuma ?!
    Em tempo: não costumo perder tempo com gente burra e escondida por pseudônimos, mas por acaso voltei ao Blog por outras razões e revendo esse excelente texto do Bruno, deparei-me com seu (vá lá...) comentário. E achei que o senhor merecia essa réplica ! Desculpe por te-lo conhecido...

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