O compositor Paulo Arruda. Foto por: Gustavo Pimentel |
Dando continuidade ao registro da produção pernambucana que passa longe do conhecimento do público local e que, de modo ainda mais enigmático, não é tratada pelos grandes veículos de comunicação do estado, publico a entrevista que fiz com o compositor, arranjador e contrabaixista Paulo Arruda. Nessa extensa - contudo, sólida - conversa, o artista fala sobre sua trajetória, perspectivas estéticas, seu trabalho composicional, dentre vários outros pontos que naturalmente foram emergindo em suas considerações.
"O músico é através de sua música." - John Coltrane
Bruno Vitorino - Primeiramente gostaria de perguntar: por que a música? Fale-nos um pouco de sua trajetória.
Paulo Arruda - Desde criança sempre tive interesse por arte em geral. Primeiro
foi o desenho; assistia aos programas do desenhista Daniel Azulay e praticava
nos seus cadernos que eram vendidos em bancas de revista na época. No início da
adolescência, comecei a aprender violão com amigos e a me interessar por
música. Como a maioria dos jovens da minha época, ouvi muito rock e música
popular, mas alguns tinham interesse em música erudita e aos poucos fui
adquirindo alguns discos que eram devidamente emprestados aos colegas. Desta
época, lembro-me de ouvir basicamente Beethoven, Bach, Liszt e Mozart. Os
discos eram caros e praticamente só se encontravam obras até o período
romântico; música de concerto moderna, só tive a oportunidade de ouvir muitos
anos depois. Também ouvia e gravava em fitas os programas Clássicos Especiais
da Rádio Universitária, onde tive contato com a música de alguns compositores
brasileiros como Villa-Lobos e Camargo Guarnieri. Como o desenho também me
fascinava, fui com o amigo Mário Robson, que já era um grande desenhista na
época, ter aulas com o professor Sílvio Gomes e, alguns anos depois, com o
mestre Eugenio Paxelly - que é um grande artista plástico, tanto no desenho,
pintura ou escultura - em seu belíssimo estúdio então instalado na Casa da
Cultura.
Mas posso dizer sem dúvidas que a música sempre foi minha grande
paixão. Com a ajuda do grande amigo Dilton Monteiro, que estudava no
Conservatório Pernambucano de Música, aprendi a ler um pouco de música e arriscava
sozinho em casa estudar alguns exercícios do método A escola de Tarrega do
Oswaldo Soares, os 12 estudos do Villa-Lobos e algumas peças de autores
brasileiros; estudar teoria pelo livro da Maria Luisa Priolli, e dos raros
livros que me chegavam à mão. De quando em vez, assistia de penetra algumas
aulas de teoria e percepção no Conservatório.
Trabalhei durante anos como designer especializado em computação
gráfica (como era chamado na época); passei por produtoras de vídeo e trabalhei
em televisão também. Tinha uma vida estabilizada, mas bastante estressante,
quando decidi largar tudo e me devotar à música por completo. Era a hora de dar
início a uma nova vida, cheia de desafios e, como todos sabem, vinte e seis
anos já é uma idade avançada para começar os estudos sérios na área, mas pude
contar com professores e amigos iluminados que me ajudaram a trilhar este novo
caminho.
Entrei para o Conservatório e fui estudar baixo elétrico com o
professor Marcos Araújo, que foi para mim como um novo pai (o meu tinha
falecido poucos anos antes); sua enorme bondade com todas as pessoas e,
especialmente com seus alunos, suas aulas que não eram só de instrumento, mas
principalmente harmonia, onde o Marcão (como era conhecido) simplesmente era
genial, pegando músicas simples e transformando-as em obras monumentais. Grande
arranjador que me ajudou a escrever arranjos e disse que trocasse o baixo
elétrico pelo acústico que, aí sim, eu teria bastante trabalho. Comprei um
acústico, mudei de curso e fui estudar com o professor José Chagas. Em seguida
dei continuidade aos estudos com outro grande mestre, o professor Thales
Silveira, com quem continuei estudando baixo acústico, e também me ensinou
harmonia e arranjo durante três anos em sua escola particular (hoje, chamada Tritonis).
O ensino de harmonia e arranjo aqui em Recife era praticamente nulo, quem
dominava o assunto raramente passava a frente o conhecimento (segundo me
contaram músicos mais velhos), e o professor Thales Silveira com seu magnífico
curso vem formando ótimos profissionais e ajudando no enobrecimento da
atividade musical em nosso Estado.
Ao mesmo tempo ingressei no curso de Licenciatura em Música na
Universidade Federal de Pernambuco, onde também tive professores que me
ajudaram bastante. Aulas maravilhosas com os professores Sérgio Dias, Nelson
Almeida e, principalmente, o querido professor Dierson Torres, que leciona
harmonia e estética, muito me ensinou e ainda tem para ensinar!
BV – Razão ou
emoção: qual a centelha que desencadeia uma composição?
PA - Creio num intercâmbio constante entre razão e emoção. Trabalho
muito improvisando ao piano e vou sempre anotando ideias e guardando para serem
utilizadas em seu devido tempo. Durante este processo de busca, deparo-me às
vezes com um material que não permite ser anotado e arquivado; ele (o material)
quer ser trabalhado exaustivamente até sua solução e neste caso você se envolve
muitas vezes de forma neurótica (auto-hipnose), quase que doentia em resolver
um determinado problema composicional. Mesmo desta forma, a emoção não trabalha
sozinha, embora muitas vezes ela mostre em que direção a música deve seguir.
Nesta parte entra a razão para dar preenchimento aos espaços, perceber se uma
boa ideia rítmica não encobre uma textura ainda em processo de maturação. Ou
seja, o ato de descobrir o que não funciona, o que não tem força musical, tem
sido um dos meus maiores desafios.
Vou
dar um pequeno exemplo: através do material no qual estou trabalhando vou
anotando as ideias em poucas pautas, para posteriormente passar à orquestração,
mas posso deixar indicado que instrumento ou naipes tocarão determinado trecho;
algumas vezes tenho que refazer toda a orquestração de uma parte por ter
confiado demais em processos orquestrais sólidos (a razão), e não ter buscado
os desafios impostos para esta etapa do trabalho, arriscando combinações e
cores que fogem das estruturas comuns das texturas orquestrais. Pode funcionar
ou não! Serão precisos mais alguns anos de análise e estudos aprofundados a fim
de adquirir a estética sonora que busco. Se vou encontrar, ainda não sei, mas
tenho me esforçado para isso.
PA - Acredito
que é difícil para todo o mundo. Claro que em alguns países têm-se maiores
oportunidades, mas que não garantem a independência do músico apenas através da
arte de compor. Não se pode viver apenas de composição por aqui, mas de outros
trabalhos como arranjos, tocar em orquestras, música para cinema e
documentários, dar aulas ou até fazer outros trabalhos não ligados à música.
Isso torna muitas vezes o tempo escasso para a produção composicional, mas o
que fazer?
Escrevendo
isto, lembro-me imediatamente de uma frase do compositor Mário Ficarelli: “o
compositor, com raríssimas exceções, é um homem comum, ou melhor, incomum,
porque além de trabalhar (e muito) para manter a si e a sua família, ainda
trabalha tudo outra vez para manter e tentar elevar o nível cultural da
comunidade e não ganhar nada mais por isso.” Uma definição perfeita do nosso
grande compositor.
E
pretendo fazer isso, continuar tocando, fazendo arranjos, dando aulas até, quem
sabe um dia, poder sobreviver apenas de composição, mas já sabendo de antemão
que o caminho é bastante tortuoso e complexo. Não que eu esteja reclamando do
que venho fazendo, mas todos sabem que o sonho do compositor é viver de sua
obra, e para sua obra.
BV – Num mundo onde a arte é cada
vez mais rebaixada a mero entretenimento e a experiência artística é
substituída por espasmos de euforia compartilháveis nas redes sociais, como
diminuir o abismo que separa a música erudita do grande público?
PA - É árdua a tarefa de fazer com que a
música de concerto chegue ao grande público. A culpa não é destas pessoas, mas
dos meios de produção cultural que não estão em nada preocupados com a
disseminação da alta cultura, não apenas em relação à música, mas das artes em
geral. Não trato apenas do caso da erudita, mas da vastíssima cultura musical
pernambucana, como o frevo, maracatu, forró e caboclinhos que se encontram cada
vez mais afetados pelo multiculturalismo implantado nos meios de difusão cultural.
A
Orquestra Sinfônica Jovem do Conservatório Pernambucano de Música (na qual atuo
como contrabaixista) cumpre bem o papel desta difusão. Através das viagens da
orquestra pelo interior do Estado, a música erudita chega a milhares de pessoas
que antes nunca tiveram acesso. A prova maior disto é que todos os lugares em
que tocamos estão sempre lotados e, depois dos concertos, as pessoas vêm
conversar conosco - emocionadas - e com um sentimento de gratidão tão sincero
que sensibiliza e nos deixa sem dúvidas do quão importante é o nosso trabalho.
Como podemos dizer que as pessoas não gostam, já que nunca tiveram a
oportunidade de entrar em contato com este tipo de arte? Outro ponto de vasta
importância deve ser citado: antes dos concertos, o maestro José Renato Accioly
e a OSJ fazem um concerto-aula para crianças da rede estadual de ensino e para
quem estiver disposto a assistir também; começando pela apresentação dos naipes
orquestrais, depois os instrumentos individualmente e a função do regente na
orquestra; ao final, trazemos uma criança para reger a orquestra, um momento
belíssimo que sempre termina com muitos aplausos e onde se pode notar a
felicidade dos pequeninos em contato tão próximo com a Grande Arte. Muitas
crianças presentes nestas aulas estudam música em projetos sociais ou do
próprio Conservatório e, ao verem e ouvirem a orquestra, tomam a decisão de que
realmente vão seguir a carreira musical.
Quantos
jovens temos em nossa orquestra que foram frutos de projetos como este?
Inúmeros que, apesar das enormes dificuldades encontradas por quem quer fazer
música com seriedade no Brasil, abraçaram o desejo de devotar suas vidas à
música.
Em
nosso Estado, precisamos de mais orquestras, bandas sinfônicas, grupos de
frevo, e de uma atenção especial ao tipo de iniciação musical que está sendo
aplicado em nossas escolas. Tenho conversado com várias pessoas que tem filhos
no ensino fundamental e eles têm me relatado coisas absurdas, como se fazer
pesquisa sobre o grupo Menudo ou apresentações cantando funk e brega! Onde está
a culpa disto? Nas universidades? Os recém-formados professores não conseguem
observar além daquilo que os foi ensinado na própria academia? Esse tipo de
conduta deve ser execrado das nossas escolas, ou vocês não conseguem perceber
que nossas crianças estão sendo intelectualmente estupradas.
Dois
fatos recentes (na academia e na grande mídia) confirmam isto: a polêmica
causada há alguns meses com o coral da USP, onde os calouros foram
recepcionados com uma música das mais rasteiras possíveis. Ora, se dentro das
universidades vemos coisas do tipo, o que esperar dos estudantes de iniciação
musical que são formados por estas instituições? E no Jornal Nacional, da TV
Globo, quando da morte do Claudio Abbado não foi citado que o maestro italiano
foi aluno de um dos nossos maiores músicos, o maestro Eleazar de Carvalho.
O brasil omite o Brasil.
BV – Sendo mais específico no quesito produção musical,
como você enxerga a música e seus desdobramentos intrínsecos em Pernambuco?
PA - Tenho observado e analisado durante anos dois aspectos
que considero fundamentais em relação às atividades musicais em nosso Estado:
indivíduos que mal sabem afinar seus instrumentos fazendo ‘música’ (com o
devido perdão à música, pelo uso da palavra), e críticos que são incapazes de
elaborar qualquer consideração válida ou mesmo básica sobre a arte dos sons, e
que defendem de forma doentia toda a encenação promovida por esses ‘músicos’
(também o devido perdão aos músicos, pela aplicação do termo), e desta forma
encontram o perfeito equilíbrio da ignorância com a mediocridade – vocês fazem
de conta que são artistas e nós fazemos de conta que sabemos escrever sobre o
assunto.
Infelizmente,
são a maioria. Existe um abismo desmesurado em Pernambuco entre as pessoas que se
dedicam com real comprometimento à música e outras que tem como desígnio a
banalização, transmutando-a à esfera do entretenimento vulgar.
Para
analisar este ponto, gostaria de fazer uma citação sua que li aqui no blog:
“grupos formados por músicos desprovidos do mais elementar domínio técnico de
seus instrumentos, que esbanjam uma poesia (?) sem sentido algum, apresentam
cantores desafinados e constroem em torno de seus integrantes uma aura
milimetricamente deliberada de artistas sérios, criativos e inovadores.”
Classificando ao final como a “consagração do mal feito”, termo que considero
perfeito!
Vejamos.
Em entrevista o compositor recifense Willy Corrêa de Oliveira nos traz a
seguinte observação: “você só se relaciona com uma linguagem, só se exprime
numa linguagem quando você a conhece”. Já ouvi até dizerem que se você estudar
muito você perde o feeling!
(condicionamento bastante normal num país em que o ex-presidente afirmava não
ler livros, porque lhe davam dor de cabeça, e da atual presidente que não
consegue lembrar o nome do livro que a emocionara tanto) Ora bolas! Ser músico
significa estudo em tempo integral da linguagem e da técnica, seja você
instrumentista, cantor, compositor ou regente. Se o indivíduo não tem a música
como prioridade em sua vida, ele não é honesto consigo e muito menos com o seu
público. A vida e o fato de se fazer música não se separam. No meu caso, por
exemplo, dedico a maior parte do dia a tarefas musicais: compor, estudar
contrabaixo, piano, regência, ouvir muita música e vários outros estudos e
leituras relacionadas como religião, política, filosofia e história, que estão
intimamente conectados ao desenvolvimento da música por séculos, mas que para
estas pessoas isto passa completamente despercebido. A música se tornou, nas
mãos destes, um fantoche do grotesco.
E
para deixar a situação mais grave, essa aura é completamente sustentada e
aumentada pela crítica “especializada” como o suprassumo da criação musical,
mas não se enganem, porque praticamente não existe nos jornais e na TV alguém
que possa tratar do assunto com a devida sensatez. É sempre comum ler nas
matérias de música aqui em Pernambuco críticos agarrados literalmente à letra e
bobagens visuais e pirotécnicas que não colaboram em nada a compreensão
musical, apenas confundindo o leitor ou telespectador com termos abstratos. Tem
que analisar a letra? Claro que sim! Mas e a música? Fale-me da música! Como
disse o compositor russo Igor Stravinsky: “[os críticos] não estão sequer
equipados para julgar nossa ‘gramática’. Não veem como é construída uma frase
musical, não sabem como se escreve música; são incompetentes quanto à técnica
da linguagem musical contemporânea”. Se no tempo deste grande compositor os
críticos já eram falhos, imaginem hoje com o aparato da doutrina gramscista
dentro das nossas universidades e da imbecilização coletiva promovida pelos
meios de comunicação de massa, em comunhão com o governo?!
Mas,
nem tudo é detrito! Temos ainda várias pessoas e grupos que primam pela
qualidade estética da arte musical, e acreditam que desta forma podem ajudar na
(re)construção de uma sociedade que se encontra esfacelada moralmente e que foi
brutalmente afastada de toda manifestação artística sincera.
São
poucos, mas ainda os temos.
BV – Você faz parte da Orquestra Retratos, do grupo Quarto
Aberto e da Orquestra Sinfônica Jovem que focam respectivamente na música
regional, na improvisação jazzística e no universo erudito. Como esses três
campos repercutem em sua produção?
PA - A Orquestra Retratos (que terá o seu primeiro disco “De
Sol a Sol” lançado em breve) prima pela qualidade técnica e estética sonora do
grupo, que é formado por instrumentos de cordas dedilhadas. O maestro e
bandolinista Marco Cesar que durante vários anos está à frente do trabalho,
frisa como é importante o refinamento também na música popular, trabalhando
elementos musicais como fraseamento, dinâmica e cor orquestral dentro deste
grupo. Trabalho maravilhoso, e que em breve poderá ser visto em algumas cidades
do nordeste, através da tournée da
orquestra no segundo semestre deste ano (as datas serão divulgadas em breve).
O
grupo Quarto Aberto é formado por Fred Lyra e Wallace Seixas nas guitarras,
Hugo Medeiros na bateria e por mim no contrabaixo. Para mim, tocar com esses
grandes amigos sempre foi uma experiência de aprendizado enorme. Hugo com seus
avançados estudos de polirritmia, sempre trazendo novos desafios para todos,
além de um som magistral que sabe tirar do instrumento; prova de um músico que
tem se dedicado durante anos no aperfeiçoamento da arte. O que dizer do meu
amigo Fred Lyra? Que ama Bartok e Steve Coleman! Um músico de concepções
maravilhosas, em que percebo a sutileza de Webern, ao mesmo tempo em que
caminha para a violência rítmica e hipnotizante de Stravinsky. E do meu querido
Wallace Seixas, que anda levando nossa música para o mundo todo. Com dois
discos lançados e um livro maravilhoso com suas composições e arranjos. Saudade
de tocar com os senhores!
A
Orquestra Sinfônica Jovem do Conservatório Pernambucano de Música foi
extremamente importante em minha formação e decisão de seguir por completo a
composição. A orquestra com iniciativa do maestro José Renato Accioly vem
tocando compositores pernambucanos consagrados como Capiba, Clóvis Pereira e,
dando espaço para jovens compositores mostrarem suas obras como foram os casos
de Mateus Alves com sua “As Duas Estações Nordestinas”, Ivan Souza com a “Suíte
Norjazztina”, Sérgio Ferraz com o seu “Concerto Armorial para violino e
orquestra” e a minha obra “Cangaço de Vida e Morte”.
Sobre
a forma em que lido com os três campos, é que cada um desses trabalhos trazem
características diversas, mas sempre se pode aproveitar matéria e elementos de
um para outro. Acho esse intercâmbio precioso e bastante construtivo no que diz
respeito à percepção e intuição musical. Posso dizer que continuo aprendendo
muito com todos eles.
BV – Apesar do
título, seu poema sinfônico “Cangaço de Vida e Morte” evita o regionalismo
caricato e apresenta uma construção narrativa que privilegia o inusitado. Como
se deu o processo composicional dessa obra?
PA - O cangaço levou quatro anos para ficar
pronto. Trabalhava nele durante os períodos de férias na universidade. Um dia
perguntei ao maestro José Renato Accioly se poderia tocar com a Orquestra Jovem
do Conservatório uma obra minha, e ele aceitou plenamente a ideia. Terminei a
obra, que iria ser tocada pela orquestra no final de 2012. Mandei a peça para o
Concurso Tinta Fresca que é realizado pela Filarmônica de Minas Gerais, e com
grande felicidade soube que a peça tinha sido selecionada e seria tocada pela
Filarmônica em setembro daquele ano.
No
texto que escrevi para ser usado no programa do concerto digo o seguinte: nesta
composição, intitulada Cangaço de Vida e Morte, busquei delinear não apenas a
imagem do cangaço como fenômeno social, mas outros aspectos que o envolvem;
imagens e sons característicos do sertão nordestino. A Caatinga, a seca, a fé e
também a desesperança.
Como
você observou, a peça foge do regionalismo estereotipado que temos aqui em
Pernambuco. Ele o regionalismo existe, mas não está escancarado como em obras
que seguem essa estética. Não que isso seja ruim, adoro a música Armorial, ela
corre em nosso sangue, não podemos negar isto. Mas, procurei ir mais longe,
trabalhando com elementos modernos e desta forma encontrando um equilíbrio
entre o novo e a tradição.
BV – Essa composição foi
selecionada na 4ª edição do concurso Tinta Fresca promovido pela Orquestra
Filarmônica de Minas Gerais, uma das mais importantes do país. Como foi essa
experiência?
PA - Sobre o Tinta Fresca, posso dizer
que foi uma das experiências mais emocionantes da minha vida. Os dias que
passei em Minas foram de imenso aprendizado com o júri, formado por Marlos
Nobre, Ronaldo Miranda e Mário Ficarelli (que faleceu este mês em São Paulo) e
da vivência com os colegas compositores Andersen Viana, Hermilo Santana,
Rodrigo Hyppolito, Luigi Antonio Irlandini e Carlos dos Santos que foi o
vencedor da edição com o seu maravilhoso Noturno.
Experiências
do tipo deveriam ser obrigatoriamente repetidas com todas as orquestras do
país. Tem muita gente escrevendo, mas, é sempre difícil conseguir a execução de
uma peça sinfônica. Tive a chance através da Filarmônica de Minas e, espero que
outras orquestras façam o mesmo, pois, mesmo com todos os esforços envolvidos,
e que são muitos, a contribuição para a nossa música deve vir a ser sempre
maior.
BV – Quando o público
recifense terá a oportunidade de ouvir essa peça?
PA - No dia 28 de maio terei a grande
honra de ter o Cangaço de Vida e Morte executado pela Orquestra Sinfônica do
Recife sob a regência do grande compositor Marlos Nobre. Creio que seja um novo
caminho que está sendo trilhado pelo nosso maior mestre. Com a reestruturação
da nossa Orquestra Sinfônica, através do Marlos Nobre, que vem tocando
constantemente novas peças de jovens compositores e, inserindo a música
brasileira de concerto em todos os programas, como no último concerto o ano
passado, em que o repertório foi todo de compositores brasileiros. Isso nos
traz uma alegria e esperança imensas, de que um novo e fértil período está se
instalando no que diz respeito à música de concerto em Pernambuco.
BV - Quais os planos para o futuro?
PA - Estou
finalizando uma obra comissionada pelo maestro Nilson Galvão para a Orquestra
Criança Cidadã, que se chama Música para Cordas e Percussão em três movimentos:
I.Quaerere, II.Via, III. Nanciscor (que significam procurar, o caminho e
encontrar). Trabalho com a ideia de busca que carregamos por toda a vida,
principalmente no que diz respeito a busca espiritual de cada um. Este projeto
foi idealizado pelo juiz João José Rocha Targino, onde alunos da comunidade do
Coque tem aulas de teoria, solfejo, percepção e instrumento. É importante
destacar que muitos destes jovens já atuam em orquestras profissionais, o que
evidencia a seriedade com que o trabalho é feito.
Também
venho trabalhando numa nova peça para grande orquestra. Não devo citar o nome,
pois vou enviá-la para concursos de composição.
Para
o percussionista Emerson Coelho da Orquestra Sinfônica Jovem do CPM, venho
trabalhando no Concertino para Vibrafone e Orquestra de Câmara.
Um
concerto para Violão e Quinteto de Bandolins para o Guilherme Calzavara e o
Quinteto de Bandolins do Recife, grupo criado pelo maestro Marco Cesar em que
tocamos música popular e erudita também.
Venho
trabalhando também em poemas do Joaquim Cardozo, alguns para voz e piano e
outros para coro. Estou fazendo estes trabalhos com voz me preparando para
escrever uma longa obra com o texto do Morte e Vida Severina do João Cabral de
Melo Neto, que é um dos meus livros preferidos. Para esse trabalho pretendo
usar grande orquestra, coro, solistas e narrador. Sei que uma obra desta
envergadura vai me tomar alguns anos de trabalho e muito estudo!
Estou
estudando agora com o professor Marcílio Onofre, no curso de extensão em
composição (COMPOMUS) na Universidade Federal da Paraíba. Marcílio é um ótimo
professor e tem me ajudado bastante a conhecer as novas técnicas de composição,
além de pesquisar bastante sobre as novas formas de técnicas expandidas em
vários instrumentos. Ao final do ano, farei a prova para tentar ingressar no
mestrado em composição da UFPB.
E
no próximo ano tentar gravar meu primeiro disco, que vai se chamar: Cangaço de Vida
e Morte e Música de Câmara.
Sigamos
com Deus!
Excelente entrevista Paulo. Assino embaixo.
ResponderExcluirInaldo Moreira
Parabéns Bruno Vitorino e Paulo Arruda pela bela entrevista. Fico feliz por saber que ainda existem pessoas como vocês. Possuidores de um grande talento musical na sua mais pura essência, com sensibilidade e beleza indescritíveis. Continuem assim e nos privilegiem com sua música!!
ResponderExcluirCristina Monteiro