quinta-feira, 19 de abril de 2012

The Walking Dead - por Bruno Vitorino

Paul McCartney

No dia 21 de dezembro deste ano, o Recife será tomado pelos zumbis! A “Zombie Walk Recife” – em sua 5ª edição – reunirá centenas de entusiastas de filmes de horror fantasiados de mortos-vivos promovendo um verdadeiro apocalipse zumbi na cidade. Contudo, quem não conseguir esperar e quiser participar de uma prévia cuja temática seja os errantes putrefatos que vagam ao léu em busca de carne fresca onde lhes for possível encontrar terá ótimas oportunidades. De hoje até o próximo domingo, moribundos vindos diretamente das tumbas do mundo pop irão mostrar seus rostos carcomidos na capital pernambucana: Chico Buarque, Los Hermanos e Paul McCartney.

Exatamente, meu leitor imaginário, você não me entendeu errado. Eu afirmei que o poeta redentor dos olhos azuis, os quatro prodígios barbudos do pop nacional e o cavaleiro místico do reino encantado do rock estão mortos! Afirmo categoricamente e peço que me perdoe o atrevimento de não repetir discursos prontos, diluídos em papinha e postos à venda (a preços elevados) para o consumo dos indivíduos que se julgam acima da média intelectual de seus semelhantes. Gostaria também de previamente esclarecer que não busco me colocar como o “do contra” e sim como o arauto da dúvida, porque se a inércia abençoa a ignorância, a incerteza liberta o pensamento. Portanto, sigamos!

O primeiro baile zumbi acontecerá hoje no Teatro Guararapes e se estenderá por quatro dias consecutivos numa farra dionisíaca. O preço da entrada é caro – em média R$ 240,00 – por isso só os escolhidos presenciarão. No palco, Chico Buarque de Holanda, um músico/poeta falecido nos anos 1980, que soube, porém, construir ao redor de sua carcaça artística uma aura messiânica que o colocou acima de tudo – da música em si ao olhar crítico – e que vem se aproveitando dessa redoma cristalina para devorar não a carne (talvez o cérebro), mas o dinheiro dos devotos os quais se entregam em sacrifício inebriados pela ilusão do triunfo da arte numa liturgia macabra de provação intelectual. Música conservada em formol, vendida como nova. Popular no campo das idéias, porém, na prática, destinada ao consumo de intelectualóides endinheirados. Falei sobre todo esse rito num post anterior aqui no Variações para 4.

Outro aguardado evento temático acontecerá amanhã no Chevrolet Hall: a apresentação do grupo Los Hermanos no Abril Pro Rock na nova (?) turnê em comemoração aos seus 15 anos de carreira. Assassinado friamente por seus próprios criadores em 2007, o quarteto carioca volta do mundo dos mortos para apresentar sua enfadonha mesmice ao público recifense. E quando digo “mesmice”, meu caro leitor, refiro-me à falta de criatividade e ousadia artística dessa promissora banda que há cinco anos anda cambaleante a requentar seu repertório e não escreve uma nova melodia sequer. Ao contrário, acostumou-se a convenientemente se levantar do túmulo quando seus integrantes precisam de dinheiro para tocar adiante seus inexpressivos projetos pessoais. Para que se dar ao trabalho de criar se existe uma legião de fanáticos que se deixam abocanhar de maneira tão delirante? Melhor relançar em vinil toda a sua discografia e se cercar de um robusto aparato midiático para dar ares de relíquia sagrada a mais uma sacada mercadológica.

Por fim, aquele que morreu em 10 de abril de 1970 ao anunciar publicamente o fim da mais relevante (note que não uso o predicativo “melhor”) banda de rock da história... O mais bem sucedido morto-vivo da atualidade: Sir Paul McCartney! Com a passagem pelo Recife da turnê “On the Run” nos próximos sábado e domingo, o músico inglês proporcionará ao público pernambucano o maior flash mob zumbi já visto por estas terras. A estrutura é gigantesca: 800 toneladas de equipamento de última geração, 200 profissionais trabalhando na montagem e produção do evento, mais de 40 técnicos e um palco que terá 70 metros de largura e 26 metros de altura. Pirotecnia tecnológica feita para deslumbrar. Somam-se a isso duas qualidades de Sir Paul indispensáveis à sedução da platéia brasileira ávida por atenção: simpatia e interatividade. Fez até um teaser convocando o rebanho a ser devorado, quer dizer, o público, para ir ao estádio do Arruda assistir ao concerto garantindo-lhe vultosas descargas de adrenalina. Mas a pergunta que paira no ar é: e a música?! Bem... Será a mesma que McCartney vem tocando e vendendo em conserva ao redor do globo há 42 anos! Levando em consideração que sua produção musical pós-Beatles oscila entre o regular e o medíocre, o foco do show será obviamente os hits do Fab Four. “Sempre mais do mesmo. Não era isso que você queria ouvir?”

Não se espante, meu leitor! Ainda sou senhor de minhas faculdades mentais e tenho plena consciência de que “os homens não querem ser perturbados em suas lendas e não gostam que lhes mudem sua verdade”. A certeza alicia o indivíduo para depois aprisioná-lo numa zona de conforto. Por isso, ouso não me curvar de modo complacente em veneração à carniça de certas divindades artísticas sem antes me questionar do porquê de minha reverência. O passado está para ser lido e interpretado, não para nos amarrar ao saudosismo do hipotético Éden cultural. A música é viva, meu caro, e tem de seguir adiante!

21 comentários:

  1. Caro Bruno, respeito sua opinião. Principalmente em relação ao Los Hermanos. Estes sim, deveriam voltar a produzir porque são jovens e talentosos. Agora lançamento de caixa de raridades é demais para mim!

    Quanto a Chico Buarque, concordo em termos de ingresso e jamais como compositor.

    Em relação a Paul McCartney, questiono apenas uma coisa:

    "Quantos discos da carreira solo dele você já ouviu?"

    Costumo sempre afirmar uma coisa. Primeiro eu escuto, depois eu julgo! Honestamente, Pernambuco irá assistir aos dois maiores shows de sua história musical nos dias 21 e 22. Obviamente, que depende do conceito musical.

    Beatles - ingavelmente gênios da melodia. Talvez para uma área mais racional, como o jazz, que em várias de suas vertentes foca na descontrução musical, não seja tão interessante. Mas, ainda assim, existia uma melodia prévia para ser desconstruída. Uns assumem este risco, outros não, concorda?

    Excelente texto!

    Gilberto da Costa Carvalho

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  2. Coquito, respeito muito o seu texto. É uma aula de português, muito bem embasada. Tirando o zumbi gringo e os 4 inúteis, que realmente não me farão falta. Chico, Jair Rodrigues, João Gilberto, Milton, Caetano, Bethânia, Baden, Tom, Vininha, são hoje para mim, um alicerce da música bem executada, principalmente na voz serrada e desafinada de Chico, que consegue promover letra e melodia, imortalizada, rompendo a ditadura. Com certeza, não direi "Cálice" para você. Obras que não vivem de sucesso, que não têm tempo, lugar e principalmente idade. Nunca serão velhas e nem novas, mas serão eternas. O que você sugere então? Sei que você não é "do contra". O que tem de bom para você na atualidade?

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  3. Respeito demais a opinião do autor, mas para mim, o texto cai no círculo vicioso da pseudo-intelectualidade, que reina em terras tupiniqiuns.

    Carlos Eduardo Montenegro

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  4. Amigos,

    O autor sabe que comungo da mesma opinião dele.
    Concordo com tudo o que foi falado...e talvez eu fosse um pouco mais ácida, porque ando meio sem paciência pra artistas que pararam no tempo...
    Arte, na minha humilde opinião, é movimento, no sentido de produção, progresso. Os 3 supracitados não tem produzido mais nada valoroso (estou tomando por base o que eles mesmos produziram outrora - e que produção!, porque costumo nivelar por cima).
    Pelo contrário: sempre que tentam fazer algo novo, não cola. Ou quer me convencer que algo novo de qualquer um dos três suplanta os seus sucessos do passado??
    Devo admitir que musicalmente são 3 belezas, cada uma em seu estilo.
    Adoro o LH até o Ventura. Ia pros shows e curtia mesmo os caras. Mas eles se perderam e não me cabe ficar engrossando o coro de palmas batidas pra maluco dançar...se tornaram criaturinhas deprimentes e depressivas. Umas velhas chatas que vivem esmolando. Ixe!
    Quanto a Chico, sua produção entre 60-80 é realmente "estupefante" (se essa palavra existir, é isso...é pra cair o cabelo mesmo!). Não há como negar. Mas depois disso, ou seja, há mais ou menos 30 anos, ele desceu a ladeira valendo...
    Nosso querido Sir...esse realmente é um malandrão...enquanto esteve nos Beatles foi um prodígio, mas sozinho provou que não era grande coisa e que viveu à sombra de você-sabe-quem...
    Eu não tenho lá grande simpatia por você-sabe-quem (acho que o nome sagrado dele consta na galeria dos super-valorizados), mas não tenho como negar que o homem sabia compor hits pops como ninguém.
    Então eu não tenho como tirar a razão do autor do texto.
    Ele está certo...infelizmente.
    Infelizmente porque a gente vai ficando cada vez mais sem opção. Ou passamos o resto da vida cantando o passado e achando isso bonito ou aprendemos a gostar das porcarias que se produz hoje em dia.

    Tati Monteiro

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  5. Excelente texto Brunão...

    Mas tu sabe que sou fã do Chico né? hehehehehe Tá ótimo.

    Abração meu caro!

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  6. Como o espaço aqui serve pra discordar, vou fazer algumas considerações ao texto do amigo Bruno Vitorino. Já que o texto é bem amplo, vamos por partes. Quanto à Chico Buarque só concordo com as vírgulas e do ponto final, mas Ângelo tem muito mais conhecimento e embasamento da obra musical de Chico Buarque para redarguir os argumentos levantados por Bruno.
    Quanto ao Los Hermanos a minha opinião é semelhante. Pelo menos a impressão que dá é essa mesma. Estão nessa pra levantar trocados, apesar de os mesmo negarem com toda veemência. Se estivessem mesmo tão interessados na banda estariam ao menos compondo algo novo.
    As minhas críticas estão centradas basicamente para os comentários sobre Paul MacCartney. Primeiramente, dizer que Paul MacCartney morreu quando encerrou os Beatles é desconhecer ou no mínimo ignorar o q ele fez posteriormente. Que há coisas lastimáveis no repertório solo de Paul MacCartney é inegável (mas vamos ser justos, me informem se alguém com 22 discos-quantidade de discos solos de MacCartney- só lançou coisas no mínimo boas). No entanto, achar que discos como “BAND ON THE RUN”, “WILD LIFE” E “FLAMING PIE” são regulares é porque ou não gosta de música pop bem feita ou não gosta MESMO do estilo de música do artista e por essa razão é pouco provável que tenha ouvido, mas vamos sair do campo das especulações.
    Outro aspecto que realmente não entendi. “plateia brasileira ávida por atenção”? Por que razão a brasileira quer atenção? Aliás, porque ela é tão ávida assim por atenção? Há pelo menos 10 anos o Brasil está inserido dentro das grandes turnês mundiais de diversos artistas dos mais variados gêneros, portanto não entendo essa AVIDEZ por atenção do público brasileiro. Outro ponto: É óbvio que há várias músicas dos Beatles, mas há uma divisão razoável entre a carreira solo dele e as músicas do repertório dos Beatles. Inclusive há uma música do disco novo dele (que por sinal é de “Standards” do JAZZ). Um show desse tamanho, por certo, não é para tocar músicas do disco novo( coisa que ele já fez em outros lugares). Afinal de contas, isso é um show de música pop, no qual essas “ vultosas cargas de adrenalina” são esperadas.
    Por último, “A música é viva,..., e tem que seguir adiante”. Concordo plenamente, mas tem que fazer por merecer. Deixo para que o próprio Paul MacCartney responda a isso: “Quando ouço o argumento de que eu devo abrir caminho para os mais jovens, respondo de imediato: ‘ Que eles abram o próprio caminho! Se forem melhores do que eu, vão me derrubar!’”. Se Paul MacCartney ainda possui relevância musical (apesar de você pensar em contrário) ou há algo de errado com a música produzida desde o início da carreira solo dele ou o que ele produziu e ainda produz (inclusive na sua carreira solo) é bastante significativo.
    Há ainda outros pontos que mereceriam uma análise, mas já me estendi por demais.
    P.s: Apesar das discordâncias, gostei muito do texto, menos do “arauto da dúvida”. Ehehehhehehehhehe!

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  7. Bruno, muito bom seu texto, principalmente pela fundamentação, concordo plenamente com sua argumentação, e gostaria de acrescentar o seguinte: No que diz respeito a Chico Buarque, já deixei claro em outra oportunidade, o penso a respeito dessa turnê, onde nós, humildes serviçais, deveríamos estar honrados pelo privilégio de assisti-lo, por uma bagatela de R$ 350,00, valor insignificante para tamanha grandeza da apresentação de sua majestade, "O Cantor, O Poeta, O Político"..., e tal horaria, não tem preço.
    No que diz respeito aos Hermanos, esses estão aqui para faturar uns trocados, aproveitando-se do público fiel existente no Recife, local onde sempre foram muito bem recebidos. Infelizmente ainda tem pessoas que ainda pagam para ouvir as mesmas músicas, numa apresentação sem emoção, sem interação entre o grupo e a plateia. Quanto ao show de MacCartney, não sei nem o que dizer, concordo com Bruno, e também com Tatiana quando ela diz que, ele viveu à sombra de você sabe quem, e nós sabemos, do Beatle Lennon. No meu ponto de vista, acho a produção musical solo de MacCartney medíocre, já fiz várias tentativas, mas não gostei de nada até agora, o que me levar a concluir que ele é melhor em parcerias (foi assim com Lennon, e também com Michael Jackson), desempenhando seu papel de coadjuvante.
    Gosto dos Beatles (quem não gosta?), gosto de Chico (não tudo), e também de algumas músicas dos Los Hermanos, mas tudo tem seu tempo. Acredito, que seria mais digno da parte desses cantores, preservar a memória musical de cada um, e a contribuição que deram ao nosso acervo musical, mas penso que, se Chico Buarque e Los Hermanos, realmente quisessem fazer uma releitura de sua obra, com o objetivo de proporcionar aos seus fãs, boas recordações, fizessem uma apresentação gratuita, em local aberto ao público, com acesso livre para todos, e não um show excludente como o de Chico, tendo em vista a exorbitância do valor do ingresso. Quanto a Paul MacCartney, só tenho a lamentar, pois não vejo nada que justifique tamanha euforia, As pessoas parecem estar extasiadas com a possibilidade de assistir ao show de um ex-Beatle, e ainda acham inadmissível não fazê-lo! Vai ver que o fato de nosso Estado, e grande parte do Nordeste, ter ficado fora da rota dos grandes shows internacionais, está gerando toda essa inquietação. A corte está reunida, viva os reis!
    Para terminar quero parabenizar Bruno pela coragem de externar seu ponto de vista, num texto bem elaborado, fundamentado em argumentos totalmente válidos, e pela ousadia em criticar, responsavelmente, dois dinossauros da música, conhecidos mundialmente, e uma banda não tão importante, mas possuidora de uma legião de fãs. Parabéns!!
    Cristina Monteiro

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    1. É possível que você esteja certo, mas nunca deixe de considerar que a música mara determinados momentos das pessos, assim como determinadas gerações. Sem falar que ela tem o condão de reviver esses momentos quando temos a oportunidade de assistir um show dessas pessoas que nos ajudaram a formamr nossa sensibilidade individual (em meio a sensibilidade coletiva). Uma kathársis ao contrário, mas uma espécie de kátharsis.
      Esses compositores fazem parte da memória afetiva de gerações, e hoje são cultuados mais pelo que foram, do que pelo que são.

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  8. ...pois é Cláudio, por esse motivo eles deveriam estar em um museu, você não acha?!!
    Amaralis

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  9. Caro Bruno, adorei seu comentário, mas em especial a foto de Paul, ela esta bastante fiel,perfeita kkkkkk
    Rodrigo

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  10. Gente!!!! tem até boneco gigante (de Olinda) de Paul MacCartney, meu Deus, o que é isso??!! é bem capaz de chamarem o cara pra ir pedir votos pra os candidatos a Prefeitos do Recife, Olinda, Jaboatão e outros...na verdade tenho certeza de que o estádio do Arruda vai virar um grande circo, onde os políticos,vão dar o ar de sua graça, pra fazer campanha, afinal eles querem ter algo pra dizer no palanque tipo, "eu fui ao show de Paul MacCartney, portanto, mereço seu voto"...só que nós NÃO SOMOS PALHAÇOS!
    É isso aí Bruno, continue assim, precisamos de pessoas com sua coragem, adorei!
    Thaís

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  11. Prezad@s, Há um outro aspecto que gostaria de trazer á consideração dos possíveis leitores. Na sociedade de massa, onde a arte é mais produto produzido em serie, a música torna-se uma espécie de "trilha sonora" da vida, tanto dos indivíduos, como de gerações. Dai o caráter iconico que alguns artistas conseguem transformar- se, ainda vivos, para seus admiradores. Isso tem um impacto considerável na própria formação de indivíduos e gerações. Por isso que determinados artistas, como Chico Buarque e Paul Macartney, tem para seus inúmeros fâs. Vejam bem, na "sociedade do espetáculo" em que vivemos, nossa própria identidade é construída na vivência e socialização com essa produção artística industrialmente difundida, como objeto de consumo. Museus, apenas para lembrar, produzem outros tipos de sentimentos, atuando mais na imaginação das pessoas que suas lembranças de momentos marcantes de suas vidas. É isso.

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  12. Ah os puristas...

    Gilberto da Costa Carvalho

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  13. Ah, os índios...foi assim que Portugal invadiu essa porra de país, com a população nativa se molhando pra qualquer branco com um espelho na mão.
    Ainda se comentou aqui que brasileiro não é um povo emocionalmente carente...
    Ontem teve gente que não dormiu porque Paul falou o dialeto local...porque Paul foi "simpático" (por 15 milhões eu seria simpática até com Suzana Vieira)...porque Paul agitou o pendão pernambucano...tenha dó!
    Se isso não for carência, não sei que outra palavra em bom português pode definir o clima "paul me ama e acenou pra mim" que tá rolando hoje nesta pobre vila, repleta de recife-ânus!
    Shame on you...

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  14. Bruno, antes de qualquer coisa, meus parabéns pelas sagazes palavras e pela ousadia em dizê-las. Achei seu texto muito bom e bem fundamentado também. Apesar de gostar muitíssimo do Chico Buarque eu concordo com você em alguns aspectos. Eu só não sei se colocaria todos numa mesma tumba. Acho importante darmos recortes históricos, entendermos que existem questões geracionais e que certos tipos de composições não voltam mais ou não mudam mais. Cada artista é um artista peculiar a seu modo. Não dá para forçar a arte de cada um a maneira que gostaríamos que ela fosse.

    Sobre os preços do show do Chico Buarque eu concordo que foi de um absurdo tremendo e muito me decepcionei com ele. Mas não me fez gostar menos de sua obra e de achar que se eu tivesse grana sobrando pagaria para ver seu show. Pagaria por gostar das composições, pagaria por achar que é um artista que fez/faz parte da história musical do meu país e pelo fetiche de ir a seu show, sim. Admito. Mas eu também enxergo a elitização que Chico Buarque faz a seu público e de forma alguma eu concordo com isso.

    Sobre Los Hermanos e Paul eu não tenho muito que dizer não. Quase não os escutei na vida, principalmente o Paul e nem fui alimentada musicalmente pelos Beatles (sou uma exceção, talvez). Apenas acho que dos citados, os Los Hermanos são os mais mortinhos. E o mais engraçado é que eles mesmos se suicidam e se ressuscitam quando acham que devem.

    Duas pessoas fizeram comentários que muito me contemplaram. Uma delas foi o Cláudio Vitorino:
    "Esses compositores fazem parte da memória afetiva de gerações, e hoje são cultuados mais pelo que foram, do que pelo que são."; "na "sociedade do espetáculo" em que vivemos, nossa própria identidade é construída na vivência e socialização com essa produção artística industrialmente difundida, como objeto de consumo."
    E a Cristina Monteiro:
    " se Chico Buarque e Los Hermanos, realmente quisessem fazer uma releitura de sua obra, com o objetivo de proporcionar aos seus fãs, boas recordações, fizessem uma apresentação gratuita, em local aberto ao público, com acesso livre para todos, e não um show excludente como o de Chico, tendo em vista a exorbitância do valor do ingresso. Quanto a Paul MacCartney, só tenho a lamentar, pois não vejo nada que justifique tamanha euforia, As pessoas parecem estar extasiadas com a possibilidade de assistir ao show de um ex-Beatle, e ainda acham inadmissível não fazê-lo! Vai ver que o fato de nosso Estado, e grande parte do Nordeste, ter ficado fora da rota dos grandes shows internacionais, está gerando toda essa inquietação. A corte está reunida, viva os reis!" Na verdade, praticamente o comentário todo da Cristina me contemplou.

    E sim Tati, infelizmente, às vezes (e na maioria das vezes) canto o passado em detrimento desse presente porcário. Amo muito do que foi produzido no passado, não vejo problema nenhum nisso e acho importante a valorização dele. Entretanto, reconheço que é preocupante quando se canta muito o passado pela falta de opção desse presente de "ai se eu te pego" e "thêthêthê".

    Para terminar, parabenizo-o, Bruno, mais uma vez pelo texto. Acho ótimo a existência de uma "voz" que difere das heterias recifenses desse "momento musical".

    PS: Enquanto eu escrevia, liga minha prima para me chamar para o show do Paul e eu respondo: "Não curto, nem escuto e por isso não pagaria para ir ao show. Vou para o Abril pro Rock assistir a Bande Dessinée!" ;D

    Beijo grande! :*


    Mayra Clara

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  15. Caro Cláudio, acho que você esqueceu da existência de museus de história natural, mas, concordando em parte com seus argumentos, acho que eles ficariam melhor em um museu de cera!
    Amaralis

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  16. Gente, o frenesi foi grande. Hoje, não se fala em outra coisa a não ser “eu fui ao show de Paul, e você?” (esqueceram até de Chico). Mas o mais interessante, é que, ao assistir o jornal hoje pela manhã, me deparei com cenas que por si só já dizem tudo, “fãs” cantando músicas dos Beatles ao serem indagados sobre a música de Paul (total desconhecimento da discografia do cantor), isso sem falar que as fotos nos cartazes e camisas, que eram de Paul quando ele ainda estava nos Beatles.
    Acredito estar havendo uma confusão, os fãs são dos Beatles, não de Paul, e tudo girou em torno disso, na verdade as pessoas queriam sentir o gostinho de ir a apresentação de Paul, como se estivessem indo a dos Beatles.
    Tudo isso demonstra o quanto estamos vulneráveis a uma manipulação em massa, o que é um perigo! Feliz colocação de Shame on you, Mayra, Tati, Thaís e tantos que externaram seu ponto de vista de forma racional, fundamentando argumentos tão bem colocados por Bruno.
    E só para registrar, ingressos para o show de Paul no domingo, foram distribuídos "gratuitamente" (quem pagou eu não sei), em vários locais e instituições (públicas e privadas), caso contrário, ele iria cantar para uns poucos gatos pingados.

    Cristina Monteiro

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  17. Prezad@s,

    Passada a tempestade fica mais fácil escrever de forma racional. Acho que a "palavra mágica" que devemos evocar é "indústria cultural", para melohor entender o fenomeno que Bruno trouxe à baila. É importante antes de qualquer coisa termos uma clara noção do significado de 'indústria cultural": processo de fabricação de artefatos "artísticos" para amplo consumo de massa, que por sua própria essencia é conservadora (por conta dos altos investimentos de infraestrutura de sua realização monetária, apostando sempre em grandes eventos e/ou shows de alto retorno, seja Paul McCartney ou banda Calypso, a lógica é uma só: LUCRO.

    De outro lado os "romanticos", como Bruno ("quem puxa aos seus não degenera"), para quem o que deve estar em jogo é o "estatuto da Arte", esse objeto que recusa definição precisa, e que hoje encontra-se em uma encruzilhada... E, para alguns, simplesmente não existe mais (o que, evidentemente, não concordo. Mais isso deverá ser uma nova intervenção do inquieto Bruno, neste Blog)

    A questão é que não estamos diante de produtos artísticos, strictu sensu, mas de divertimento e/ou entretenimento, pois é isso, que ao fim e ao cabo, a industria cultural trasnforma determinados objetos artísticos/culturais: simples entretenimento (que em verdade é um dos aspectos da Arte). Mas quando destituída de seu lado inquisidor, estético ou simplesmente racional, abastarda a Arte, amesquinhando-a, transformando a criação artístiva em simples objeto de consumo, oferecido às massas famintas de entretenimento e/ou conforto, nessa alegria esfuziante e alienada, em que as pessoas se jogam para viverem - com outros - um "momento inesquecível" de suas vidas!

    Não acho que Chico Buarque, Los Hermanos e Paul ex-Beatle sejam "zumbis"...Talvez seja mais correto chamá-los de "mortos-muito vivos", que alimentam com seus produtos reciclados massas de zumbis que se alimentam da falsa arte transformada em mero entretenimento. E aqui, toco numa questão que Bruno passou ao largo, o "distinto público". Ou, o outro lado (ou termo) da equação da industria cultural, sem a qual ela simplemente não existe!!

    Somos um povo, basicamente de iletrados e incultos (no sentido sociológico do termo, não antropológico, evidentemente), por isso a recepção do "lixo cultural" oferecido em baixelas de alumínio (apresentadas como se de prata fôsse), como podemos ver em programas como "Esquenta", por exemplo, em horário nobre do mais importante canal de televisão aberta. Um show de horrores transformado em "programa popular", com "a cara do povo" de nossa Regina Casé, como mestre de cerimônia. Buscando passar a "cultura do subúrbio", como se fosse "cultura popular".

    É isso o que faz a indústria cultural. MTV, "Esquenta", trilhas sonoras de novelas, rádio, cinema, etc., tudo isso são mecanismos dessa indústria a qual nos submetemos por falta de SENSO CRÍTICO, base do entendimento do REAL CONCRETO, como o definia hegel, de quem muitos já ouviram falar, mas de quem conhecemos tão pouco...

    Esses "velhos artistas" Chico, Paul, Bob Dilan, Madonna, Gaviões do Forró, Reginaldo Rossi, Odair José (transformado em "cult", por Caetano Veloso), as várias faces da "música sertaneja" (não confundir com "música caipira", que tem feitura artesanal)etc., são todos peças de uma máquina fantástica de alienação e divertimento, chamada INDÚSTRIA CULTURAL, que na sociedade capitalista, nesta em que vivemos, está subordinada a uma exclusiva lógica; o lucro na venda de seus produtos, quisquer que sejam.

    E nesse jogo, fãs é o nome de fantasia, pois o que somos mesmo é consumidores...

    A questão é "voce tem fome de quê"?

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  18. Cláudio, muito boa sua última argumentação, visto que, ela ficou mais fundamentada na razão do que na emoção, principalmente ao chama-los de "mortos-muito vivos", o que eu concordo totalmente.
    Cristina Monteiro

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  19. Sinto muito, por tudo que li aqui, ter-se transformado o fulcro da questão que Bruno ataca (a produção musical desses "ídolos" de que trata o artigo). Mudou-se, assim, o foco do assunto e passou-se a tergiversar sobre política cultural, indústria cultural, mobilidade cultural, direito à cultura, cultura de massas, carências culturais, mil coisas paralelas, surgidas da cabeça de cada um quando, pelo que vejo na fala de Bruno e pelo que senti nos comentários subsequentes, a coisa era muito mais simples. Arte é coisa móvel. Arte faz-se no dia a dia. Arte não se aprende em compêndios, muito embora a técnica na sua execução, sim. Arte é um elemento volúvel. Requer inspiração, requer "timing". Não se pode engessar a arte e seus conceitos, por mais estranho que pareça. Nem em Academias isso se consegue, porque o verdadeiro artista é um rebelde, um criador. No momento em que ele para de criar (o que é bastante claro nesse trio) para somente alimentar-se da sua criação passada, produção de 20, 30, 40 anos atrás, requentada por eles mesmos ou por sua legião de zumbis-seguidores, todos também mortos-vivos deambulantes, procurando restos de carniça artística vendida a peso de ouro, para satisfação do seu instinto bajulatório dos "semideuses" idolatrados, a coisa toda se transforma nesse espetáculo deprimente. Muita gente deixou de se alimentar ou de comprar uma roupa melhor, ou de pagar uma conta de condomínio, e até o leite da criançada para seguir sonambulicamente os seus zumbis-deuses. Ou a música brasileira se renova mesmo, desde a sua base, nos panteões da cultura popular, alimentada pela chamada "música de raiz", inocente, meio bobinha, mas ainda pura, até a mais articulada, cult ou culta, hermética ou erudita ou "bem trabalhada nas melodias exóticas e harmonias elaboradas" ou vamos vivenciar a decadência dessa arte quase divina. Por isso tudo, larguei o inocente rock'n'roll da minha juventude beatlemaníaca dos anos 60, onde atuei profissionalmente por 4 anos seguidos, larguei também toda uma fase de música popular genuinamente pernambucana (18 anos produzindo frevo, ciranda, maracatu e baião) e voltei à música realmente eterna, a música dos Grandes Mestres. Ou seja, tenho sido muito mais feliz retornando ao passado, que nunca deixou de ser presente. Bach, Mozart, Paganini, Vivaldi, Chopin, todos eles, enfim, estão muito mais que vivos. Estão candentes, no coração de quem realmente ama a Música-Arte, não a Música espetáculo de consumo fácil. Eles não descerão jamais às tumbas à cata de ouro podre; jamais se misturarão às hordas que lotam "arrudões" e rebolam ao som de 3 acordes a 100.000 watts RMS de potência enfadada. E se me dão licença, volto ao meu violoncello e à minha clave de Fá. Centenas de anos de estudo e várias encarnações seguidas me farão um concertista, daqui a uns bons 500 anos, eu espero.

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