segunda-feira, 26 de março de 2012

Quando o Jazz encontra o coração - por Dom Angelo


A música do século XX está marcada por diversos momentos de transformação e evolução de conhecimento intelectual, quer seja nas concepções de harmonia, melodia, ritmica, tessitura, quer seja no uso da tecnologia como veículo de abertura a exploração de novos timbres e possibilidades infinitas de composição e arranjo.
Da mesma forma que cientistas buscam abrir caminho a territórios inexplorados desta selva sem fim do conhecimento humano, no mundo das artes algumas figuras são responsáveis por caminhar no vale das sombras das incertezas lúdicas, dando metaforicamente a “cara a tapa” em defesa de suas análises da produção de conhecimento.
Ora, ora. Como em todo ramo de pesquisa, há experimentos que dão certo e os que dão errado. Não quer dizer que os que dão errado não sejam um dado científico. São sim. Porém ficam registrados com um aviso na porta: “não entre, por aqui você não chega a lugar nenhum”.
Eu poderia citar aqui centenas de artistas e grupos que se aventuraram apenas pelo caminhos frios da racionalidade teoricamente acumulada em seus cerebelos. Principalmente aqueles oriundos de correntes vanguardistas como os do Free Jazz, Avant Garde, Música Eletrônica¹, Pontilhismo, Serialismo, e muitos outros. E posso afirmar que 80% deles manifestaram-se com notas gratuitas, oriundas exclusivamente do consciente lógico.
Em contraponto a isso, é de extrema importância afirmar que já alguns artistas foram extremamente necessários para quebra de fronteiras dentre os rígidos padrões ditados como belos. Schoenberg, Webern, Stravinsky, Miles, Coltrane, Monk, Cage, Shostakovich, Prokofiev, Boulez, Villa-Lobos, Hermeto, dentre outros, são apenas alguns desses gênios transformadores.
Bom...na minha forma romântica e clássica de encarar a arte, parece me fisgar mais facilmente o artista que compartilha um pouco de sua sinceridade emotiva, mesmo que esta apareça sob a “roupagem” e a “maquiagem” da técnica científica.
Me surpreendo quando um dos maiores representantes do jazz contemporâneo, o pianista Brad Mehldau, diga-se de passagem extramamente técnico e virtuoso, oferece aos seus ouvintes uma bela versão instrumental da música “Teardrop” do grupo de Trip Hop Massive Attack, de sua versão de “Hey You” do Pink Floyd ou mesmo de todos seus arranjos para as músicas do Radiohead. Acho incrível quando a cantora Madeleine Peyroux grava sua versão jazzística para a música “Between the Bars” do falecido compositor folk-indie Elliott Smith. Acho maravilhoso quando um grupo de Jazz moderno, experimental e virtuoso como os The Bad Plus interpretam uma música como “Smells Like Teen Spirit” ou “Every Body Wants to Rule the World”. Acho belo quando o artista se rende a este dom que todos seres humanos carregam consigo em entrar em sintonia com as vibrações etéricas. Movimento, vibração, transformação. E quando nos abrimos aos nossos sentimentos (sem breguice!) de forma espontânea de encarar a vida, vimos beleza em mais coisas que imaginávamos e o mais perto de nós.
O problema é que fazemos idéias e projeções do que é bom, do que é belo. E esquecemos de observar o presente. O aqui e o agora. A única realidade do hoje.
Se sintonizarmos com o AGORA, a dança da vida fica com mais swing.

¹ Entende-se “música eletrônica” aquela ligada as escolas eruditas.

7 comentários:

  1. Grande texto meu velho! Um forte abraço.

    Giba.

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  2. Você falou em "música eletronica" me veio logo a cabeça Stockhausen. Grande texto!

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  3. Belíssimo texto amor! Beijo! :)

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  4. Belo texto, Angelito! Um convite muito interessante à história da música do século XX. Brad Mehldau é de fato impressionante. Tive a oportunidade de assistir a um concerto do seu trio em Sampa no ano de 2006 no Auditório Ibirapuera. Paguei R$ 15,00 (isso mesmo, quinze reais)... Lembro-me especificamente de dois momentos: a interpretação de "Knives Out" do Radiohead e de "O que será" do Chico Buarque. E acho que cabe nessa lembrança bastante do que você disse em seu texto.

    Outra coisa, quando li o que disseste a respeito do The Bad Plus me lembrei de imediato do arranjo deles para Fem - Etude n.8 para piano de Ligeti. Muito densa!

    Um abraço,

    Bruno

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  5. Angelito

    Parabéns, meu velho! Texto muito bonito e interessante!

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  6. massa .... excelente

    paulo gordiano

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  7. Valeu meus queridos...

    Brunão...foi graças a você que conheci o The Bad Plus. Tô ouvindo bastante eles.

    Abração!

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