sábado, 12 de março de 2016

Playlist de Editores: Março/2016


No ar, a coluna “Playlist de Editores” deste mês de março! Em pauta, de livros a filmes, passando por discos, as indicações de cada editor sobre últimos títulos do universo da cultura a que se dedicaram.

Boa leitura!



- André Maranhão:



Minha indicação vai para um pequeno livro de Caetano Veloso, intitulado “Antropofagia”, e publicado pela coleção Grande Ideias. Fruto de uma conexão entre as editoras Penguin e Companhia das Letras, o ensaio de Caetano se divide em quatro seções: A Poesia Concreta; Chico [Buarque]; Vanguarda; Antropofagia; com passagens que apontam diversas influências na trajetória de Veloso, e que vão tanto nas figuras da Rádio Nacional, da Bossa Nova (na qual Caetano se declara um grande fã de João Gilberto e discorre muitos trechos dedicados a ele); quanto na turma do Iê-iê-iê (Roberto e Erasmo Carlos); e do Rock n’ Roll (Beatles, Rolling Stones).

Mas outro ponto que também chama atenção é a costura feita por Caetano a partir de grandes trabalhos da vanguarda brasileira – seja nos desdobramentos na Semana de Arte Moderna de 1922; no Concretismo, com os irmãos Haroldo, Augusto (e o “irmão por afinidade” Décio Pignatari); nos teatros do Grupo Opinião e de José Celso Martinez; no cinema de Glauber Rocha e, sobretudo, no grande impacto de Oswald de Andrade como fonte de inspiração, que daria de alguma forma, no Tropicalismo trabalhado por Caetano, que por sua vez, um dia chegou a declarar: “a tropicália é uma neoantropofagia”!


- Fernando Lucchesi:



Falar sobre “Tubarão” é chover no molhado. Foi o filme que inaugurou a era dos blockbusters (literalmente o “arrasa-quarteirão”) em Hollywood, injetando dólares e mais dólares na indústria cinematográfica, além de alçar ao estrelato o jovem diretor Steven Spielberg. Nessa edição de 40º aniversário de lançamento, há dois documentários excepcionais: The Making of Jaws que trata sobre as complicadas filmagens do longa (nesta edição, na íntegra, ao contrário da edição em DVD que mutilou mais de uma hora do original) e The Shark is Still Working - The Impact and Legacy of Jaws, que como o próprio subtítulo explica, avalia por meio de entrevistas de fãs e de pessoas envolvidas no projeto, o legado e o impacto causado pelo filme, principalmente na cultura pop. Além desses documentários, o Blu-ray apresenta uma versão restaurada do filme, diferentes trailers de cinema e spots para televisão. Indicadíssimo para fãs do filme ou simplesmente para aqueles que querem ver apenas um grande filme de suspense/aventura.




- Rógeres Bessoni:



Revisitando a obra do mestre, só para dizer junto com o coro de milhares: Jackson do Pandeiro é pra se torar. Tenho viajado pela obra dele, passando por diversos momentos da sua carreira intensa, profícua, genial. É fantástico ver o desenho, os contornos do “espírito” musical nordestino sendo definidos – tarefa grandiosa que ele dividiu com Luiz Gonzaga e mais uns poucos. Aí você mergulha em uma experiência estética completa, desde as formas que a língua portuguesa adquiriu no Nordeste, o vocabulário, o humor ora ingênuo, ora desconcertante, e toda a carga antropológica/sociológica que vem no pacote: os forrós, as sambadas, as brigas nas festas, os namoros, a descoberta do Rio de Janeiro (e o fascínio daí advindo), os traços cômicos do povo. E além da genialidade rítmica inconteste, Jackson também tinha grandes sacadas melódicas como intérprete. Aqui eu vou destacar uma das músicas menos comentadas – e que merecia inúmeras boas regravações e homenagens: Capoeira Mata Um. Do disco “Cabra da Peste”, creditada como sendo de autoria de Álvaro Castilho e De Castro, é uma obra-prima do tipo de balanço que iria fazer tanto a cabeça dos brasileiros nos anos 70 e seguintes. E digo mais, tendo sido gravada em 1966, pela temática e pela levada, não me impressionaria nada descobrir que essa música influenciou todo o começo da carreira de Jorge Ben Jor, por exemplo, além da sua incrível aproximação com os afro sambas de Vinícius e Baden (gravados no mesmo ano). Vale muito a pena o mergulho na inventividade desse grande monstro da inventividade sonora.



- Bruno Vitorino:




Em 1995, enquanto o Sepultura - a maior banda do rock brasileiro! - pré-produzia seu clássico Roots, o Pantera trabalhava seu mediano Far Beyond Driven e o Korn choramingava problemas de relacionamento familiar e retratava toda uma geração de adolescentes com sérios problemas de autoconfiança viciados em MTV; uma banda lá dos confins da Suécia quebrava todos os paradigmas até então estabelecidos para o Metal: era o Meshuggah.

Com seu disco “Destroy, Erase, Improve”, o quinteto de Umea sacudiu o universo metaleiro. Musicalmente: agressividade, precisão, graves, e, sobretudo, padrões polimétricos bastante complexos. Melodia? Raramente, e só para criar ainda mais tensão rítmica. Poeticamente: letras afiadas sobre uma utopia pós-apocalíptica, tecnológica e desumanizada que mesclava indústria de massa, cybertech, relações de poder e desorientação ontológica. O “horror” descrito por Conrad em O Coração das Trevas, só que com uma hashtag na frente. O resultado era uma implacável sequência de porradas ritmicas que denunciava aos berros o apagamento do indivíduo idealizado pelo Iluminismo em prol do andróide sem alma criado do consumo frenético e pelo incipiente ideário eletrônico que se desenhava (e cujo resultado hoje vivenciamos). Uma paisagem sonora desnorteante e por vezes irrespirável, mas absolutamente fascinante.

Destaque para a insanidade de Future Breed Machine, o forte conflito métrico de Beneath, as inesperadas modulações rítmicas de Soul Burn, os constantes deslocamentos de acentuação rítmica em Transfixion e a tessitura métrica de Sublevels. E antes que me esqueça: dê-se ao trabalho um olhar mais atento às letras do baterista e virtuose Tomas Haake. Valerá o esforço, vá por mim.

Altamente recomendado!



- Giba Carvalho:


Luiz Melodia é um artista único. Após 13 anos, o “Negro Gato” nos presenteia com um excepcional álbum de inéditas. “Zerima” é uma simbiose perfeita de ritmos e influências. Certamente por dois motivos inerentes a sua carreira. O primeiro é o respeito ao tempo e aos sentimentos musicais na hora de compor.  E o segundo, é por ele não forçar a barra para que tais inovações surjam. O processo com Melodia é totalmente espontâneo. E, em minha opinião, é daí que o verdadeiramente novo surge. A demora é totalmente justificada pelo compromisso com a qualidade e com o que é de fato faz-se relevante para a música nacional.

A reaproximação de Melodia com suas origens do samba, torna-se cada vez mais clara. Notadamente após o estupendo Acústico MTV (o melhor de todos que foram produzidos no Brasil), estas mudanças voltaram com tudo. Como se o lado neotropicalista tivesse ficado no passado e o minimalismo oriundo das cordas e instrumentos percussivos voltassem a bater no coração do Melodia. Tal mudança nos proporciona com clareza, uma percepção prática e estética de quão magnífico é o Luiz, muito embora, ele sempre tenha corrido à margem no rótulo de sambista.

No álbum, encontramos ainda participações especiais. Na dissonante (em termos de arranjo) releitura de Maracangalha (Dorival Caymmi), temos a participação de Mahal Reis (filho de Melodia) que introduziu um trecho rap no balanço que toma conta da canção. E, na maravilhosa Dor de Carnaval, a participação é de Céu. A junção da versatilidade ímpar de Melodia com o modo único da cantora-compositora paulista cantar tornam esta canção uma das “maravilhas contemporâneas” do trabalho. O restante é uma verdadeira AULA de bom gosto e de um excepcional crooner brasileiro.

“Zerima” nos traz um Melodia disposto, cheio de inspiração e com muita vontade de fazer música de verdade!

COMPLETAMENTE INDISPENSÁVEL!


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