Nesta segunda edição da coluna
“Variações em 5/4”, os editores comentam “Django Livre”, o mais recente filme
de Quentin Tarantino.
- Dom Ângelo:
Dando continuidade a uma filmografia de
sucesso como diretor e roteirista, Quentin Tarantino sem dúvida já entrou no
time dos monstros sagrados da história do cinema mundial. Seguindo uma linha de
trabalho que preza qualidade e não quantidade, a exemplo de Kubrick, Fellini e
Scorsese para citar alguns nomes, podemos dizer que Tarantino mantém um padrão
altíssimo de talento em sua obra. Fã inveterado de filmes Spaguetti Western, Wuxia, Noir e de
filmes Blaxploitation, sua
arte é uma brincadeira de recortes e colagens de várias influências estéticas
do mundo das artes visuais.
Vejo Tarantino mais como um artista que
consegue cruzar, misturar e ao mesmo tempo harmonizar influências completamente
distintas umas das outras, beirando de fato uma certa genialidade por causa
disso. Porém sua característica marcante é a de trazer mais a tona sua natureza
como apreciador da arte do que propriamente como criador, celebrando e
homenageando padrões estéticos de sua infância (Tarantino nasceu em 1963). A
prova dessas homenagens estão inclusive nos títulos de dois de seus filmes. Um
seria do filme noir britânico de 1972 estrelado por Michael Caine chamado Pulp.
O outro agora, Django, remete a um dos spaguetti westerns que teve muitas
sequências, sendo o original estrelado pelo ator Franco Nero em 1966.
Em seu novo filme intitulado Django
Unchained, Tarantino coloca o poder mais uma vez na mão dos fracos e oprimidos.
Já teve mulher violentada que virou heroína (Kill Bill), negro de classe baixa
que ficou rico (Jackie Brown), Judeus metralhando nazistas (Bastardos
Inglórios) e agora escravo explodindo casa de aristocrata rico do sul dos
Estados Unidos. Apesar de tudo, é sensacional a forma em que são usados esses
clichês intencionais e metafóricos. Na verdade, Tarantino realiza pela tela do
cinema os mais profundos desejos de revolta e vingança entranhados no
inconsciente da raça humana, causando uma sensação de alívio e dever cumprido,
apesar de toda violência visual. Por outro lado, achei importante o diretor ter
se redimido do simbólico de ter colocado um bando de alemães nazista dentro de
uma sala, metralhando e incêndiando a mesma (Bastardos Inglórios). Pois dessa
vez um dos heróis do filme e talvez o mais importante é um alemão. Diga-se de
passagem mais uma vez uma excelente atuação do ator Christoph Waltz.
Django é um filme relativamente longo (2h e 45min), mas não
cansa. Pode ser considerado sim um filme de faroeste, mas com uma nova
linguagem visual, novos heróis, outras trilhas sonoras (apesar da participação
de Enio Morricone) e um novo tipo de violência. A dita violência
explícito-cômica (relativamente parecida com as utilizadas nos Wuxia). No mais,
é um bom filme (mas, não ganhou o Oscar). Me diverti muito assistindo-o. Indico
a todos. Escravatura foi uma das coisas mais absurdas que aconteceram na
história. Racismo é uma das maiores estupidez da mente humana.
- Fernando Lucchesi:
Um dos cineastas mais cultuados da
atualidade, Quentin Tarantino estabeleceu um novo padrão para contar estórias
repletas de violência gráfica, digna dos filmes de Peckinpah, entremeadas com
diálogos afiadíssimos sobre cultura pop. Seu mais novo filme “Django Livre”
retoma algo próximo do seu último, “Bastardos Inglórios”, uma estória em que a
vingança é o tema principal, dentro de um determinado período histórico, nesse
caso a época da escravidão americana.
Mais uma vez, Tarantino acerta em cheio
e produz uma galeria de personagens memoráveis, com destaque para o caçador de
recompensas, King Schultz, vivido brilhantemente por Christopher Waltz. Assim
como no seu filme anterior (e como há muito ele explora nos seus filmes), o
tema da vingança se sobrepõe tornando os vilões cada vez mais odiosos. Junte-se
isso a um tema explosivo como a escravidão, e você terá personagens únicos como
Calvin Candie (Leonardo di Caprio) e seu fiel ajudante Stephen (Samuel L.
Jackson). Este merecia facilmente uma indicação ao Oscar.
Muito se falou da violência do filme
como o tiroteio dentro da casa grande ou a cena dos cachorros que devoram um
escravo vivo. Quem conhece a obra de Tarantino, sabe que ele nunca foi adepto
de sutilezas na hora de filmar violência. A intenção de Tarantino é inundar a
tela de vermelho. A violência gráfica nos seus filmes, muitas vezes, ao invés
de chocar, provoca risos, uma vez que o exagero é tão evidente que não tem como
o espectador não colocar um sorriso (ainda que de leve) no rosto. Outra
característica, o humor negro, está presente na hilariante cena em que membros
da KLU-KLUX-KAN resolvem discutir se as túnicas que eles usam são apropriadas
ou não.
Tarantino, como todo grande cineasta,
parece ter encontrado sua fórmula de desenvolver personagens e estórias. E não
hesito em dizer: cada novo filme dele, é uma experiência única, goste você do
filme ou não.
- André
Maranhão:
Uma das coisas mais notáveis confirmadas em Django Livre é o
fato de Quentin Tarantino mostrar-se um crítico a opressões como o racismo e a
escravidão sem precisar cair no drama para fazê-lo. Como disse o próprio
Tarantino: “Quem não quer ver um escravo vingando-se do senhor malvado ou do
capataz?”. O filme parece não superar outros êxitos do cineasta (como Pulp
Fiction e Bastardos Inglórios) e sua trama às vezes aparenta ser muito longa se
pensarmos que Tarantino buscou um diálogo com o gênero Spaghetti Western. É
notório em Django Livre, o seu elenco, desde outra grande atuação de Christoph Waltz,
como também a boa impressão causada por Jamie Foxx como um protagonista de
Western e a interpretação de Leonardo di Caprio em um de seus raros momentos
como vilão na história do cinema.
- Bruno Vitorino:
Um escravo alforriado por um alemão caçador de recompensas
busca resgatar sua esposa de um latifúndio algodoeiro no sul dos Estados Unidos
numa epopéia de sangue, violência e morte. O que poderia ser, a princípio, um leitmotiv absurdo vira uma obra-prima
sob o prisma insano (no melhor dos sentidos) de Quantin Tarantino. Misturando
faroeste, escravidão e mitologia nórdica; Django Livre mergulha na atmosfera
tensa do Mississipi do século XIX para subverter a História e se vingar das insanidades
cometidas pelos opressores de então: os coronéis das plantations.
No geral, o filme é marcado pela sanguinolência exagerada e
cômica dos revólveres de balas infinitas e mocinhos de pontaria sempre
certeira. Contudo, o longa perturba o espectador nas cenas de violência contra
os escravos, pois a agressão ultrapassa crueldade física para alcançar os mais hediondos
contornos morais. Com este artifício, Tarantino coloca o público no lugar do
escravo para que ele sinta na pele os tormentos infligidos a esse Homem pela nefasta
instituição – o comércio de escravos - que o esvazia de seu caráter humano e o “coisifica”
como um objeto qualquer.
Em resumo: as atuações são impecáveis, o enredo é muito bem
construído, o filme é tecnicamente perfeito. Altamente recomendado!
- Giba Carvalho:
Django
Livre é um filme de atuações impecáveis. Tarantino mete novamente o dedo na
ferida, remoendo temas que deviam ser esquecidos na memória estadunidense.
Fotografia e cenários belíssimos, excelente elenco e roteiro. “Um divertido
espetáculo de violência.”